AÇUCENAS LUZIDIAS – poema de namibio ferreira/Angola*
BARCO de PAPEL – poema de manoel de andrade*
Quem sabe por tantos barcos
navegarem a minha infância
herdei essa enorme ânsia
por navios, terras e mares.
Nesse mar dos meus pesares
meu porto é uma ilha perdida
e assim naveguei na vida
passageiro do horizonte.
Hoje pergunto a mim mesmo
se não remei sempre a esmo
a bordo do meu batel…
com meu sonho de criança
navegando a esperança
num barquinho de papel.
*manoel de andrade é poeta e autor do livro “Cantares” com sucesso no lançamento.
?POR QUE NO TE CALLAS? – por joão batista do lago*
O QUE QUIS DIZER JUAN CARLOS COM: ¿POR QUE NO TE CALLAS?
Quando o Rei Juan Carlos, de Espanha, mandou que o Presidente Hugo Chavez, de Venezuela, calasse a boca, ele não estava necessariamente advertindo a pessoa do presidente venezuelano, tampouco a instituição presidencial do país de Chavez; também, de forma alguma, o rei espanhol estava ali defendendo a dignidade do Governo do qual é locupletário ou das instituições políticas nacionais; e muito menos, ainda, o povo espanhol.
Não. Absolutamente não. Juan Carlos, em verdade, estava ali desde sempre – defendendo o quinhão da Europa rica e, consequentemente, o “status quo” do imperialismo capitalista-econômico-financeiro, que se traduz no conceito de “Consenso de Washington”. Quem observou muito bem isso (aos meus olhos de maneira intuitiva, isto é, inconscientemente) foi o Presidente do Brasil, Lula, ao inferir que ele, o rei, é que seria o patinho feio da reunião dos países latino-americanos, em Chile.
O ¿por que no te callas?, não é, como o reducionismo da imprensa festiva latino-americana – e mundial –, sob o aparato das elites econômicas internacionais, detentoras de 90% da riqueza mundial, pretendeu fazer crer a “nosotros ciudadanos”. A frase, recheada de indignação cênica, contra o que chamaram de desrespeito ao povo espanhol, não passa de engodo, de jogo cênico dos senhores donos do mundo. Representa um “aviso” aos governos latino-americanos que não querem se enquadrar ao sistema do “deus mercado”, hoje cognominado de “Convergência Universal”, que é a versão light do consenso de Washington, que, definitivamente, fracassou, sobretudo depois da “quebra” do México.
O ¿por que no te callas? é, assim, o aviso do imperialismo capitalista-econômico-financeiro, albergado por esse novo conceito de “Convergência Universal”, menos exigente e que, ainda, permite esquecer que “Washington” sugere, mas jamais cumpre o receituário por ele próprio proposto.
Entretanto, nada disso foi mostrado ou discutido pela imprensa festiva latino-americana e mundial. Quatro razões estão na base dessa não-informação: 1) o interesse dos grupos econômico-financeiros que detêm o poder da Comunicação e das Comunicações; 2) a incompetência geral da rede de profissionais desses setores, esvaziados que foram de quaisquer compromissos com a verdade; 3) a pauta do medo a partir das desregulamentações propostas – e postas em práticas – pelos governos latino-americanos, em obediência aos ditames dos senhores donos do mundo; 4) A desqualificação do trabalho, e com este, do trabalhador ou operário, ou proletário.
A imprensa festiva, então, precisava dizer alguma coisa. Daí, sob o comando dos senhores donos do mundo, sob a batuta das oligarquias econômicas mundiais, sob o reinado de um rei proscrito pela América Latina e sob o poder dos oligarcas das Comunicações, resolveu partir para a demonização pura e simples do outro ator, que diga-se de passagem, não passa também de um ditador de meia-tigela: Hugo Chavez, mas que tem tido o mérito de enfrentar os imperadores e os imperalistas.
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* joão batista do lago é poeta, escritor, pesquisador, jornalista e pensador empiricista.
SINTOMAS DE TUA AUSÊNCIA – poema de altair de oliveira
Chove lá fora e é inverno no meu peito
A tua ausência desenha um mundo cinza
O teu contágio latente manifesta
Garimpo o teu perfume rarefeito…
Tudo em mim te cobra e te precisa.
Meu coração de válvula sangrenta
Me impregna na mente e me ordena:
“Te procurar feito louco entre as caras!”
Me põe na rua atropelando medos
Pra te encontrar no sul da madrugada
Nua de todo e qualquer que nos separe
Ardendo em febre e o amor preso entre os dedos.
A CÓLERA DE ZEUS – editoria.
No entanto, Zeus soube que os cinqüenta filhos de Licáon cometem atos tão terríveis quanto os do pai. Por isso, vestido como se fosse um pobre vagabundo, Zeus apresenta-se na casa deles. Apesar de toda a sua maldade, acolhem o deus disfarçado, pois seguem as regras da hospitalidade. Convidam-no a comer com eles. Trazem para a mesa uma panela enorme. Zeus cheira a comida, e seu coração se aperta de horror: entre os miúdos de carneiro e cabrito, reconhece pedaços de carne humana. São os restos do infeliz Nictimo, o qual seus irmãos não hesitaram em assassinar para comer. É demais! Revoltado com esse crime odioso, Zeus transforma todos os canibais em lobos e devolve a vida a Nictimo. De volta ao Olimpo, o rei dos deuses, desgostoso com a espécie humana, resolve afogá-la sob um dilúvio imenso, que vai engolir o mundo inteiro.
Enquanto prepara esse cataclismo, os homens, sem nem desconfiar do que os espera, dedicam-se a suas ocupações terrestres. Mas um deles, Deucalião, rei da cidade de Tia, visita seu pai, o titã Prometeu, que mora nas montanhas do Cáucaso. Prometeu, que ama os seres humanos (a quem outrora já deu um presente de valor inestimável, o conhecimento do fogo) e sabe o que Zeus está projetando, avisa seu filho. Assim que volta a sua cidade, Deucalião começa a derrubar grandes acácias, a serrá-las em tábuas e ajuntá-las em pranchas. Ao fim de muito trabalho, termina um grande navio, uma arca que parece ter caído no meio da terra seca. Deucalião e sua mulher, Pirra, instalam-se no barco e passam a morar ali.
Um dia, o vento sul começa a soprar com rara violência, acumulando no céu pesadas nuvens negras que escondem a luz do Sol. Milhares de relâmpagos rasgam as nuvens. No meio da assustadora e incessante barulhada dos trovões, a chuva começa a cair brutalmente. Gotas enormes salpicam a poeira dos caminhos e formam uma massa de água que se espalha sobre a Terra.
A água sobe tanto que destrói e engole as cidades do litoral e, depois, os vilarejos das planícies. Quando os céus se acalmam, o mundo inteiro é apenas um imenso mar. De longe em longe, avista-se o pico do que um dia foi uma montanha e agora não passa de uma ilhota. Apenas Deucalião e Pirra sobrevivem, flutuando em sua arca. Durante nove dias, ficam à deriva, na mais completa desolação. Pouco a pouco, as águas começam a recuar, e a arca chega a uma ilha que, na verdade, é o alto do monte Parnaso.
Deucalião e Pirra, hesitantes, pisam a terra, que não esperavam rever. Imediatamente, agradecem ao grande Zeus havê-los poupado e oferecem-lhe um sacrifício. Depois, perto de onde a arca encalhou, descobrem um templo cujo telhado está coberto de algas e conchas. É o santuário de Têmis, deusa da justiça.
Com toda a humildade, Deucalião e sua companheira suplicam aos deuses que reconstituam a espécie humana. Zeus emociona-se com o pedido e envia seu mensageiro, Hermes, para anunciar que concederá o que desejam. Então, surge Têmis, que ordena: – Cubram suas cabeças! Peguem os ossos de sua mãe e joguem-nos para trás! Muito surpresos, Deucalião e Pirra entreolham-se e perguntam ao outro: – Que a deusa quis dizer? Afinal, eles não têm a mesma mãe… E que ossos podem ser esses! De repente, uma idéia os ilumina: qual é a mãe de todos os homens? A Terra! Seus ossos são as pedras que a cobrem…
O casal sai recolhendo todos os pedregulhos que encontra. Depois cada um cobre sua cabeça e, por cima dos ombros, joga as pedrinha para trás. Assim que elas tocam o chão, transformam-se em seres humanos. As pedras jogadas por Deucalião viram homens. As lançadas por Pirra, mulheres. E os dois devolvem a vida à humanidade.
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