O poeta HÉLIO DE FREITAS PUGLIELLI é entrevistado pelo poeta JAIRO PEREIRA / curitiba.pr

  1. “Fúria em silêncio/império do Nada/rua Augusto Stelfeld 824”. (Autoretrato). Este excerto de poema da coletânea inominada de 67, com outros poetas do Paraná, dá mostra da força de sua poesia. O Hélio, é um poeta que nunca quis se mostrar?

Me mostrei até demais.,,inclusive o endereço, que há 20 anos não é mais esse. Muito jovem, entre 1957/60. pintei e bordei na página literária de “O Estado do Paraná” (que infelizmente deixou de circular este ano). Quando dediquei a página inteira a alguém que não sabia ser “persona non grata” do diretor do jornal, ele acabou com minha festa.

2.Seu olhar crítico acompanhou gerações de criadores no Paraná, focando mais na área de literatura. Como você avalia, a atual literatura no Estado?

Antigamente as pessoas escreviam, mas dificilmente publicavam livros. Hoje não é tão difícil publicar e vários escritores que nasceram e/ou vivem aqui conseguiram projeção nacional.

  1. A internet, a seu ver, é matriz determinante na evolução ou involução das linguagens poético-literárias?

Às vezes os meios são neutros, mas muitas vezes afetam o conteúdo. Creio que a internet faz alguns escritores involuírem e outros evoluírem. Tudo depende dos propósitos e da habilidade no uso dos recursos proporcionados pela WEB.

  1. Ainda muito jovem você escreveu um ensaio interessante: “O SER DE PARMÊNIDES CHAMA-SE BRAHMA”. A filosofia te persegue e reflete sempre na sua produção intelectual?

“O Ser…” é um pequeno poema escrito na maturidade, com intenções filosóficas, sim. Até hoje sou grato aos raros amigos que entenderam o texto (três ou quatro escreveram a respeito) e confesso que me desgostou a incompreensão de alguns que não entenderam ou fizeram-se de desentendidos.

  1. O intelectual, ao contrário do criador livre e loucos de todo gênero é o ser que por seu próprio juízo e razão, expõe o bem e o mal do mundo?

Para o meu gosto sim. A maioria do que se faz agora é literatura que não cheira nem fede, feita por criadores que nada têm de loucos e, por isso mesmo, não são portadores da chama (nem sagrada nem profana). Na minha concepção, se não for criador, um pouco louco e não mexer com o bem e o mal, nenhum escritor pode ser considerado grande. Veja o Guimarães Rosa: criador, louco pela linguagem e se imiscuindo no bem e no mal. Só poderia fazer grande literatura.

  1. Sente-se no Paraná e no Brasil, a ausência de críticos… Em que sentido isso é ruim pra literatura e a poesia?

Com o atual domínio por parte do mercado editorial e da mídia, não surpreende a ausência de críticos. Quem pode ser independente nessa engrenagem? Agora só temos teses de mestres e doutores em literatura. Quando essa gente faz textos críticos, em geral é uma coisa chatíssima, mas há exceções, é claro.

  1. O Hélio intelectual de formação acadêmica e o Hélio de cultura mundana, poética, crítica… combinam até que ponto?

“Formação acadêmica” no sentido de ter estudado e lecionado na Universidade Federal do Paraná (onde também estudou meu pai, filho de imigrante italiano pobre). Sempre fui inconformista e nunca derrapei na “literatura sorriso da sociedade”.

  1. Nessa entrevista que puxa sempre mais para o literário, o crítico, e o poético, é importante saber: o Hélio de Freitas Puglielli tem um projeto presente/futuro em ação?

Meu projeto presente é viver o “aqui e agora”. O projeto futuro é editar alguns livros que estão dormindo na gaveta há muito tempo e outros nem tanto.

9.A literatura oficialesca, no sentido de editorial, (aos que conseguem chegar numa editora) estabelecida, a seu ver representa o que há de melhor na produção paranaense e brasileira?

Aí é difícil julgar, pois a literatura não-oficialesca tem baixa visibilidade  para que se possa realmente comparar.  Mas li muita coisa boa nas revistas, internet e livros editados pelos próprios autores. Cito um amigo falecido, Sérgio Rubens Sossella e outros vivos que você, Jairo, sabe bem quem são.

  1. Como você vê o futuro do livro, da poesia e da literatura, ante a força arrebatadora dos meios eletrônicos (facebook, blogues, links…)?

Não tenho nenhum fetichismo com relação ao livro de papel. Os e-books se multiplicam cada vez mais e acho muito cômodo fazer download, já que não me incomoda ler diretamente no monitor, ao contrário daqueles que têm de imprimir primeiro para depois ler. A revolução da informática/internet eclodiu numa escala maior do que a revolução gutemberguiana. Queiram ou não, os efeitos tendem a ser irreversíveis.

  1. O ser transmoderno (internético) pode tornar-se anti-reflexivo, ou a velocidade dos links, não altera a performance do pensar?

Sem dúvida a reflexão demanda tempo. Mas não tem que ser necessariamente lenta. A performance do pensar sem dúvida está se alterando. Bobagens e sandices foram ditas em todas as épocas. Se bobagens e sandices são ditas hoje, a culpa é da desqualificação cultural dos que nem sabem usar o Google adequadamente para ampliar seus horizontes.

Parabéns ao entrevistador!

3 Respostas

  1. O Vidal foi mais rápido e publicou o texto sobre Parmênides, onde também são feitas considerações sobre Heráclito e Aristóteles. Uma publicação necessária, acho. Muito bom o verbete da Wikipedia. A maioria dos leitores do meu poema não entendeu nada (ou muito pouco) exatamente por falta de informação. Afinal, nem todos podem ler nas entrelinhas, sem um mínimo de conhecimento. Não deu para perceber que o poema discutia a contradição entre o ser e o vir-a-ser, entre o ser e o não-ser, entre o ser e o tempo e entre finitude e infinitude. O “tempo” de Heráclito, que ele chama de movimento, é claro que existe, é uma evidência empírica. Já o ser de Parmênides, eternamente imóvel, só poder ser aceito em combinação dialética com o movimento (um é a negação do outro). Essa é a idéia desenvolvida no poema (com outros condimentos ocultos, um deles descoberto pelo Zola Florenzano) que finaliza com um grito de indignação contra o ser imóvel (representado pelo indiano Brahma, por ter também as qualidades do Ser parmediano). É isso aí, amigos Cleto e Vidal e quem mais estiver nos lendo.
    Namastê!…como diriam os brahmanianos…

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  2. Cleto, você até parece um escoteiro da cultura (“sempre alerta”) e num abrir e fechar de olhos pegou o pião na unha…
    Como já encontrei em sebos muitos livros autografados pelo autor (alguns conhecidos meus), não me abala também compartilhar essa situação (inclusive já sabida, pois tinha visto um anúncio num sebo virtual, quem sabe do exemplar que você conseguiu…).
    “O Ser”… foi publicado há 20 anos (escrito 1 ou 2 anos antes). A crítica mais penetrante foi feita pelo Sergio Rubens Sossella e a que realmente me emocionou foi a do Brigadeiro Zola Florenzano, pai do jornalista Emílio (este, que você deve ter conhecido, prematuramente falecido). O Zola pai, a última vez que indaguei, estava ainda vivo, centenário, um homem inteligente, perseguido por razões políticas e que, para sobreviver, acabou se tornando “best-seller” com seus livros jurídicos.
    Veja como são as coisas: um amigo quis ser gentil e passou uma nota sobre o “Ser” para o colunista Dino Almeida. Outro amigo não perdoou: disse que eu estava querendo me promover (olha a ironia: ele, apesar de não ter nenhum livro publicado, acabou entrando para a Academia e eu sempre disse “não” aos convites que recebi (e que, na época, eram na base da homologação, sem disputa). Túlio Vargas, o mais insistente nesses convites, também foi muito receptivo ao que escrevi. Mas, sempre estive vacinado contra a “feira de vaidades”, ainda mais na província. Sua proposta de discussão é realmente instigante. 20 anos depois, minhas idéias (e o meu modo de sentir o Ser e o Tempo (coincidentemente o título do livro de Heidegger) não variaram muito. Quem sabe ponho alguma coisa no papel…quer dizer, no HD!

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  3. Agradou-me a visão objetiva do mundo de transição em que vivemos, no qual a enorme e velocíssima transformação dos meios de comunicação tem alterado o trabalho literário, pelo menos no que diz respeito às maiores oportunidades que hoje os escritores e poetas têm para mostrar seus trabalhos, sem estar presos ao tradicional caminho editorial de tinta sobre papel.
    Nesse sentido, também ficam mais visíveis as muitas sandices que se produzem por aí, sugerindo que elas são mais profusas que as boas coisas. Creio, entretanto, que os bons artistas são, quase sempre, tomados por modéstia ao revelar suas obras, ou por julgá-las incompletas, ou por temer falsos julgamentos. E aí escondem nas gavetas riquezas que deveriam ganhar a luz, o que não ocorre com os sandeus.
    Parabéns, Hélio, por sua visão moderna, sem temor dos novos meios tecnológicos que, como você apropriadamente diz, vieram para ficar e evoluir sempre.
    Mas quero fazer um convite/desafio: que tal voltarmos à discussão de “O Ser de Parmênides…”? Afinal, a Filó Sofia está ausente em boa parte da atual produção poética desta terra descoberta por Cabral. E faremos a comemoração do cinquentenário de seu livro, que deveria ter sido festejado há dois anos.
    Comunico que já descobri o meu exemplar em um sebo de Curitiba, anunciado como autografado pelo autor (depois revelarei quem dele se desfez…). Pode ser por aqui ou no Banco da Poesia. Tentarei ser mais rápido que o Vidal…

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