Arquivos Mensais: novembro \30\-03:00 2012

Que le vayas bién, L.F. Veríssimo! – por paulo timm / torres.rs

 

Não fora a querela entre ele e Juremir Machado da Silva, há cerca de 16 anos, poder-se-ia dizer que Luiz Fernando Veríssimo é unanimidade nacional. Algo extremamente difícil de conseguir, em se tratando de um gaúcho, cujo estilo franco e direto, além de cheio de razão, choca os “brasileiros” . Mas Veríssimo, apesar da brutalidade de  seu PAULO TIMMpersonagem clássico, o “Analista de Bagé”, é um homem doce, de hábitos simples e estilo quase “mineiro”.  Ele esteve conosco, aqui em Torres, no sábado anterior à sua internação em Porto Alegre,  no último dia 21, e semeou entre todos os que estiveram na apresentação de seu Sexteto (de cinco figuras) um pouco desta  empatia. Dava para notar, porém, seu abatimento físico. Felizmente, as notícias sobre seu estado de saúde são alvissareiras: o processo inflamatório está sob controle, está livre dos aparelhos e quase pronto para retomar suas atividades. Em boa hora, em sua coluna de hoje, no Correio do Povo, Juremir rememora sua polêmica com Veríssimo, penintencia-se por alguns excessos e, sem cair no pieguismo próprio destes momentos, revela sentimentos nobres. Parabéns, Juremir!

Luis Fernando Verissimo nasceu em Porto Alegre em 26 de setembro de 1936), filho do grande escritor Érico Verissimo, tendo passado parte da infância e adolescência nos Estados Unidos, onde apaixonou-se pelo jazz.  Ele próprio costuma dizer que custou muito a se encontrar no mundo e, especialmente, na literatura. Aos 75 anos, porém, tornou-se um dos mais conhecidos escritores brasileiros, com mais de 60 livros publicados. Suas s crônicas e textos de humor, com de sátiras de costumes, publicados diariamente em vários jornais brasileiros são tão apreciadas que até estimulam plagiadores a multiplicá-las apocrifamente pela Internet…Sãos os famosos hoaxes  criados e divulgados à sua revelia.  Verissimo é considerado o autor brasileiro mais citado nesse gênero. Ele é também cartunista e tradutor, além de roteirista de televisão, autor de teatro eromancista bissexto. Já foi publicitário e copy desk de jornal. É ainda músico, tendo tocado saxofone em  conjuntos que fizeram época em Porto Alegre. Um intelectual, enfim, no que isso tem de afinidade com as formas expressão da alma humana, avesso às incursões mais intrincadas das teorias e filosofias que tentam explicá-la.

Isso fica patente, numa  lembrança de seu primeiro jornalzinho infantil em família –     “O patentino” – nos personagens que criou e que cativaram o público: Ed Mort , Velhinha de Taubaté , Analista de Bagé , As Cobras , Família Brasil , Dorinha. E também nas suas tiradas, que, de tão felizes e prolíficas, ficam difíceis de serem selecionadas. De qualquer forma, almejando o pronto retorno de Veríssimo ao nosso convívio – e Torres lhe espera no veraneio ! – eis algumas, pinçadas, aliás, da rede:

1. Uma pessoa que é boa com você, mas grosseira com o garçom, não pode ser uma boa pessoa.

2. As pessoas que querem compartilhar as visões religiosas delas com você, quase nunca querem que você compartilhe as suas com elas.

3. Ninguém liga se você não sabe dançar. Levante e dance.

4. A força mais destrutiva do universo é a fofoca.

5. Não confunda nunca sua carreira com sua vida.

6. Jamais, sob quaisquer circunstâncias, tome um remédio para dormir e um laxante na mesma noite.

7. Se você tivesse que identificar, em uma palavra, a razão pela qual a raça humana ainda não atingiu (e nunca atingirá) todo o seu potencial, essa palavra seria “reuniões”.

8. Há uma linha muito tênue entre “hobby” e “doença mental”.

9. Seus amigos de verdade amam você de qualquer jeito.

10. Nunca tenha medo de tentar algo novo. Lembre-se de que um amador solitário construiu a Arca. Um grande grupo de profissionais construiu o Titanic.

Governo é derrotado na Câmara e dinheiro do petróleo não vai para educação

Câmara aprova royalties sem dinheiro para educação. União dos estados que não produzem petróleo imprime derrota ao governo da presidente Dilma Rousseff, que queria exclusividade das verbas do petróleo destinadas para a educação

Os deputados dos estados não produtores conseguiram fazer valer sua força na Câmara e derrubaram a proposta avalizada pelo governo para um novo modelo de partilha do petróleo no país. Os parlamentares aprovaram o texto que veio do Senado, que beneficia as unidades da federação que não produzem o combustível, em detrimento dos estados produtores, como Rio de Janeiro e Espírito Santo. Com a decisão, a educação não vai mais receber 100% dos lucros dos futuros contratos. O projeto agora segue para sanção presidencial.

VEJA AQUI COMO VOTOU CADA DEPUTADO

petróleo educação congresso

Marco Maia preside a sessão. União dos não produtores de petróleo leva o governo Dilma a sofrer derrota e dinheiro não irá para a educação. Presidente poderá vetar o projeto.

A previsão de destinar os lucros para a educação ficou definida na semana passada. O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, ficou responsável pela articulação com parlamentares da base. Em reuniões com as bancadas do PT e aliadas, ele transmitiu a sugestão da presidenta Dilma Rousseff. O deputado Carlos Zarattini (PT-SP), relator do texto na Câmara, acolheu a sugestão.

Se o texto de Zarattini fosse aprovado, o dinheiro dos futuros contratos estariam carimbados, podendo ser usados por municípios, estados e União unicamente para educação. No entanto, para parlamentares contrários à proposta, acabou valendo mais o peso das alianças municipais dos deputados com prefeitos. “Pesa mais o corporativismo do que a vinculação para a educação. A discussão tem que começar do zero”, lamentou o líder em exercício do Psol, Ivan Valente (SP).

Em outubro, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou o Plano Nacional de Educação (PNE). Entre outras previsões, está a destinação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação. O governo, então, viu nos lucros vindos da extração do petróleo a forma de aumentar o financiamento para a área.

Reviravolta

Porém, a sessão desta terça-feira (6) foi palco de uma reviravolta contra o governo. O DEM apresentou um requerimento de preferência de votação do projeto aprovado pelo Senado em outubro. Com apoio de deputados dos estados não produtores – que passariam a ter liberdade para usar como bem quisessem o dinheiro que vão receber, sem ficarem obrigados a fazer vinculações -, houve uma vitória apertada. Depois, ao ser colocado em votação, o projeto teve mais apoio. Somente PT e Psol se posicionaram contra.

“Até hoje, às 13h, não havia um consenso. Me parece que não foi maturado suficientemente na consciência dos deputados. Por isso estamos votando o texto do Senado”, analisou o líder do PSB na Câmara, Givaldo Carimbão (AL). Para deputados da base, houve falta de articulação, assumida na última semana pelo ministro da Educação, Aloizio Mercadante. Até então, era a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, a responsável pela articulação política.

“Esse projeto do Senado foi mais estudado do que esse daqui da Câmara. É o melhor para os municípios, para os estados, para o meio ambiente, é o projeto do Senado”, afirmou o líder do PV, Sarney Filho (MA). Em fevereiro, o presidente da Câmara instalou uma comissão formada por 12 deputados para elaborar um novo texto. A comissão era coordenada por Zarattini e tinha ainda a presença de cinco parlamentares dos estados produtores e cinco dos não produtores.

O líder do PPS, Rubens Bueno (PR), elogiou o trabalho feito pelo grupo de trabalho comandado por Zarattini para tratar dos royalties. Porém, ele ressaltou que o substitutivo não passou por nenhuma comissão temática da Casa. Por isso, não foi discutido de forma ampla, “mais bem discutida”. “Tratar da forma que tratamos colocou em pânico vários deputados. Muitos não sabiam o que estavam votando. Decidimos pelo menos pior”, analisou.

Golpe contra o governo Dilma

Parlamentares dos estados produtores lamentaram a decisão da Câmara. O deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) lembrou que o governo tinha fechado um acordo com a base, e os parlamentares desrespeitaram. “Na política, o combinado não custa caro. O que houve aqui foi um golpe. Depois de oito meses, o resultado foi jogado no lixo”, disse Garotinho, pedindo que Dilma Rousseff vete o projeto. “Estou há 34 anos nesta casa, nunca vi isso. Parecia o programa do Silvio Santos: quem quer dinheiro?”, disparou Simão Sessim (PP-RJ).

O projeto aprovado no Senado tem poucas diferenças nos percentuais previstos no substitutivo de Zarattini. Como os dois destaques foram rejeitados pelo plenário, a proposta do senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) prevaleceu na íntegra. A maior diferença é sobre o fundo criado para receber parte dos lucros. No texto do petista, os royalties seriam divididos entre todos os estados. Já no do peemedebista, a divisão de 54,25% é só para os não produtores.

Dois destaques foram rejeitados. O primeiro foi apresentado pelo PSC. A emenda pedia que os royalties da exploração mineral tivessem os mesmos critérios de distribuição dos royalties do petróleo. O outro, apresentado pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), queria excluir do texto o artigo que faz as mudanças na distribuição dos royalties nos contratos de concessão. A intenção era garantir que os valores repassados no ano passado não mudassem até 2023.

CÂNCER: “As farmacêuticas bloqueiam medicamentos que curam, porque não são rentáveis”

“As farmacêuticas bloqueiam medicamentos que curam, porque não são rentáveis”

O Premio Nobel da Medicina Richard J. Roberts denuncia a forma como funcionam as grandes farmacêuticas dentro do sistema capitalista, preferindo os benefícios economicos à saúde, e detendo o progresso científico na cura de doenças, porque a cura não é tão rentável quanto a cronicidade.

Richard J. Roberts: “É habitual que as farmacêuticas estejam interessadas em investigação não para curar, mas sim para tornar cronicas as doenças com medicamentos cronificadores”. Foto de Wally Hartshorn

Há poucos dias, foi revelado que as grandes empresas farmacêuticas dos EUA gastam centenas de milhões de dólares por ano em pagamentos a médicos que promovam os seus medicamentos. Para complementar, reproduzimos esta entrevista com o Prémio Nobel Richard J. Roberts, que diz que os medicamentos que curam não são rentáveis e, portanto, não são desenvolvidos por empresas farmacêuticas que, em troca, desenvolvem medicamentos cronificadores que sejam consumidos de forma serializada. Isto, diz Roberts, faz também com que alguns medicamentos que poderiam curar uma doença não sejam investigados. E pergunta-se até que ponto é válido e ético que a indústria da saúde se reja pelos mesmos valores e princípios que o mercado capitalista, que chega a assemelhar-se ao da máfia.

UM NOVO CICLO? – por paulo timm / torres.rs

 

Falta muito para as próximas eleições à Presidência da República. Dilma, afinal, está no meio da viagem. Mas se as eleições fossem hoje, ela seria uma  séria candidata à reeleição. Para um “poste”, como  diziam ela ser, sem luz própria,  chegou muito longe. O IBOPE acaba de divulgar uma prévia de preferência eleitoral,  publicado no Estado de São Paulo no último dia 25, que pouca gente notou. Vejamos:

    PESQUISA IBOPE PARA PRESIDENTE: NOVEMBRO-2012
1. Se a eleição para presidente fosse hoje, em quem votaria (espontânea):

Não sabe/não respondeu 40%,

Dilma 26%, Lula 19%, Serra 4%,

Branco/Nulo 4%,

Aécio 3%, Marina 2%, outros 2%.

2. Pesquisa Ibope (estimulada): Dilma 58%, Marina 11%, não sabe/não respondeu 11%, Aécio 9%, branco/nulo 8%, Eduardo Campos 3%.

Na verdade, esta pesquisa lança mais lenha no fogo das “veleidades” dentro do PT. Diz-se que algumas lideranças superiores do Partido não estão muito satisfeitas com as evasivas da Presidenta diante do “Mensalão”, agravadas com a vacilação dela em se envolver mais a fundo na campanha de Haddad para a Prefeitura de São Paulo. As tensões não teriam alcançado, ainda, as relações de Dilma com Lula, aparentemente inabaláveis. Mas o futuro, diz o povo, a Deus pertence.

O que é real, mesmo, é que a História, como a vida, vem em ondas, como o mar. E a grande onda que se seguiu à redemocratização, cujo epicentro pode ser localizado no remoto ano de 1978, está chegando ao fim. Naquele ano, enquanto o regime militar dava sinais de recuo, num lento, seguro e gradual processo de distensão controlada, emergiam três grandes atores da renovação: Fernando Henrique Cardoso, Leonel Brizola e Lula, cada qual com seu cacife, defeitos e virtudes.

FHC era o mais visível: um intelectual de esquerda prestigiado pelas elites, com um grande capital na inteligência e mortal  pecado na vaidade.

Brizola em andanças pela Europa, reapresentava-se como herdeiro do trabalhismo tolhido pelo Golpe de 64, com grande experiência e potencial eleitoral, embora marcado pelo estilo excessivamente autoritário para a conjuntura pós-moderna que então se abria.

Lula era um enigma  que resplandecia  na crista do novo sindicalismo do ABC, com forte apoio da Igreja e insondável magnetismo, que era, ao mesmo tempo, sua virtude e vício.

Ao final de 1979, promulgada a Anistia, todos já estavam em campo,  com seus Projetos alinhavados: FHC, que alimentara a ilusão de liderar um novo Partido Socialista refluira  para o MDB, ao preço de uma espécie de suplência (sublegenda) de Franco Montoro para o Senado, nas eleições de 1978, registrando o recuo da esquerda para os liberais no clássico “O caminho das Oposições”.  Daí assumirá, em 82, o Senado, dando o salto, “à esquerda” (!), para o PSDB, levando junto combativos e insuspeitos quadros como João Gilberto , Euclides Scalco e Sigmaringa Seixas, todos deputados federais. Brizola havia lançado o PTB em junho de 1979 na famosa Carta de  Lisboa, da qual, aliás, sou dos últimos signatários. A seu pedido, a propósito, passei as Festas de Natal e Reveillon de 1980 às portas do Tribunal Superior Eleitoral, em Brasília, com toda a papelada do registro do PTB para garantir a primazia no Protocolo, tal como, aliás, registrou em primeira página a foto do JB do dia 03 de janeiro de 1980. Não adiantou, perdeu a sigla para Ivete, chorou a rasgar as letras históricas e lançou-se à dura fundação do PDT. Lembro tais fatos apenas como depoimento, visto não ter encontrado nas últimas biografias do Velho Caudilho apropriadas informações.

Lula preferiu o difícil caminho do Partido próprio, também, e andou pelo país inteiro à cata de movimentos sociais e lideranças populares emergentes para a fundação do PT.

Dos três, Brizola foi o grande perdedor, não em causas, mas em resultados. Veio a falecer em 2004 sem chegar à Presidência, já percebendo que seu Partido de desfibrava como mais uma legenda de aluguel. Lula, com o PT ocupou o espaço da esquerda, consagrando-se o condutor de uma era de mudanças modestas mas importantes, depois de 2003, ainda em curso, embora por mãos “alheias”. FHC, que fora perdendo espaço à esquerda ao longo da década de 80 para Lula e Brizola, travestiu-se em reformador do conservadorismo, desgastado pela ditadura, que lhe deu suporte e apoio eleitoral para dois mandatos na década de 90, vindo, entretanto,  a ser, até hoje, o  centro de referência da dita “direita”no país.

Evito referir-me a outros nomes, expressivos de tendências ideológicas àquela época, seja de Ulysses Guimarães, à testa dos liberais, ou Roberto Freire, herdeiro do glorioso Partidão, por uma única razão: ambos estavam mergulhados na tese da UNIDADE DAS OPOSIÇÕES, que os retiraria do proscênio como renovadores.

Enfim, o grande ciclo da Política Brasileira iniciado em 1978, que teve momentos marcantes nas eleições de 1982, na Constituinte, nas Diretas de 1989, na eleição de FHC em 1994 e 1998 e de Lula em 2002 e 2008, com repique em Dilma em 2010, está se esgotando. Dilma, aliás, é o último elo de ligação entre o tempo que se esvai  e outro que se anuncia. Brizola foi-se, sem deixar herdeiros. Poucos acreditam num agiornamento de FHC ou Lula, ambos, também, sem herdeiros “legítimos”. Ambos, acabarão, ainda, chamuscados pelos desdobramentos inevitáveis do “Mensalão”. As últimas eleições , com a diversidade de expoentes ao longo do país, parece indicar este novo tempo. Quem viver verá…

A UM POETA – de olavo bilac / rio de janeiro.rj

 

A um Poeta

 

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Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino, escreve! No aconchego
Do claustro, na paciência e no sossego,
Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!
Mas que na forma de disfarce o emprego
Do esforço; e a trama viva se construa
De tal modo, que a imagem fique nua,
Rica mas sóbria, como um templo grego.

Não se mostre na fábrica o suplício
Do mestre. E, natural, o efeito agrade,
Sem lembrar os andaimes do edifício:
Porque a Beleza, gêmea da Verdade,
Arte pura, inimiga do artifício,
É a força e a graça na simplicidade.

– Olavo Bilac, in “Poesias”

 

CELULARES: “Os Riscos da Radiação Eletromagnética para a saúde humana”

« Celulares: Paris e Porto Alegre, cidades com legislações mais restritivas

Seminário

“Os Riscos da Radiação Eletromagnética para a saúde humana”

 

Palestrantes de seminário alertam para os riscos que uso do telefone celular traz à saúde

 

Médica associou o uso de celulares a diversas doenças

Os riscos da radiação utilizada para o funcionamento dos telefones celulares à saúde humana foi o tema do painel que abriu o Seminário Estadual sobre o assunto que ocorre ao longo dessa segunda-feira (12), na Assembleia Legislativa. A primeira palestrante foi a médica Geila Vieira, uma das colaboradoras da chamada “Lei das Antenas” de Porto Alegre, que restringe a instalação de estações de rádio base na capital. Comparada à legislação da Suíça, ela restringe a colocação de antenas junto a escolas e hospitais.

Geila lembra que, antigamente, a radiação não ionizante, utilizada pela telefonia móvel, era restrita a locais fechados. Ela chamou atenção ainda, para o fato dessa exposição ser considerada de insalubridade grau médio para efeitos trabalhistas. A médica associou o uso de celulares a diversas doenças, desde cefaleia e exaustão, até leucemia.

A médica cobrou da Assembleia uma legislação mais efetiva em relação ao tema dos celulares, considerando que o assunto é um caso de saúde pública e ambiental.

Casos de câncer aumentam para quem vive perto de antenas

A engenheira Adilza Dode realizou um estudo em Belo Horizonte, Minas Gerais, na qual constatou que pessoas moradoras ou que trabalham próximo a antenas de telefonia têm mais chance de desenvolverem câncer. “E quanto mais perto pior.” O problema só diminui a partir de 500 metros. “E no caso de sobreposição, o risco é ainda maior”, explica, no caso da pessoa estar exposta a mais de uma antena. Sua pesquisa comprova que nos locais onde há mais estações de rádio base, é maior o número de pessoas que morreram de câncer.

Ela criticou a legislação brasileira por defender o mercado da telefonia e não a saúde das pessoas. Adilza chamou a atenção para o fato da Suprema Corte italiana ter dado ganho de causa a um trabalhador que alegou ter desenvolvido um tumor em função do uso do celular por cerca de 5 a 6 horas por dia, durante 12 anos. “Foi o primeiro caso no mundo”, destacou.

A engenheira listou medidas para evitar os riscos causados pelo uso de celulares:

– Usar só em casos extremos;

– Dar preferência ao uso de mensagens de texto;

– Coibir o uso para crianças e adolescentes (como o cérebro está em desenvolvimento, a penetração da radiação é maior);

– Manter o aparelho afastado do corpo;

– Atender o telefone longe de grupos e pessoas;

– Não utilizar em hospitais (onde as pessoas já estão com a saúde debilitada);

– Não usar perto de doentes;

– Grávidas devem evitar o uso, principalmente próximo à barriga;

– Não usar em veículos fechados (ônibus, trem, etc);

– Desligar à noite e não deixar perto da cama;

– Manter o aparelho afastado de próteses metálicas

Abertura

A abertura do evento foi realizada pela presidente da Comissão de Saúde e Meio Ambiente, deputada Marisa Formolo. A parlamentar salientou o apoio da Comissão, mas frisou que esse debate “deve ter continuidade pela luta social”. As telefônicas querem alterar a legislação na capital gaúcha para que possam colocar mais antenas para a instalação da tecnologia 4G durante a Copa do Mundo de 2014.

Também participaram da abertura a promotora de Justiça Ana Maria Marchezan, os representantes da Agapan, Francisco Milanez, da OAB/RS, Alexandre Burmann, e da UFRGS, professora Anelise Dalmolin.

 

Cristiane Vianna Amaral – MTB 8685 | Agência de Notícias ALRS

EGITO HOJE 23/11/2012

 

Opositores do presidente do Egito, Mohamed Morsi, começaram nesta sexta-feira (23) uma vigília na Praça Tahrir, no Cairo, contra as medidas anunciadas pelo islamita na véspera, e que concentram poderes políticos na figura do presidente.

“Todas as forças políticas revolucionárias concordaram em começar uma vigília nesta sexta”, disse em comunicado a Corrente Popular, de Hamdin Sabahi, terceiro colocado nas eleições presidenciais de junho.

Durante o dia, a polícia usou gás lacrimogêneo contra manifestantes. O confronto ocorreu em uma rua que liga a praça ao gabinete presidencial e ao Parlamento.

Pouco antes, Morsi, em discurso, garantiu que o Egito está no caminho “da liberdade e da democracia”, apesar das acusações lançadas por opositores e das cobranças da União Europeia e dos Estados Unidos.

“A estabilidade política, a estabilidade social e a estabilidade econômica, é o que desejo e é o motivo pelo o qual trabalho”, declarou em um longo discurso proferido para seus partidários reunidos perto do Palácio Presidencial, no dia seguinte ao anúncio de medidas que reforçam seus poderes.

ABDIAS DO NASCIMENTO recebe homenagem poética de PAULO TIMM: “MISTÉRIO NEGRO” – torres.rs

no dia da CONSCIÊNCIA NEGRA,  o professror PAULO TIMM  homenageou o líder do MOVIMENTO NEGRO e SENADOR ABDIAS DO NASCIMENTO com este poema publicado em diversas mídias:

Mistério  negro

 

                                                           À Abdias do Nascimento

 

Meu país negro,

Tão cheio de cores,

Totalmente negro,

Desde a estupidez flutuante

Sobre tenazes de ferro,

Inspirando os salsos  tão brancos

Das montanhas de  açúcar,]

Dos fardos de algodão,

Dos punhos engomados da sociedade  ser-vil

 

Meu país negro

Tão cheio de dores

Totalmente negro,

Na insensatez hiante,

Sobre espirais de fumo,

Delirando ternuras brandas.

No auge de abolição.

No mito da integração.

Nos sulcos magoados da  república sutil.

 

Meu país negro,

Tão cheio de amores.

Totalmente negro,

Na tez dominante,

Sobre os corpos gemidos.

Inspirando suaves mentiras

Sobre a cordialidade,

Sobre a maldade,

Nos falsos argumentos de uma democracia senil

 

 

Meu país negro,

Sorrisos negros, negras em flor

Tão cheio deles por todas partes

Tão cheio deles por todas as artes

Cheio de negros em fétidas prisões

Cheio de negras na branca perdição

Cheio de meninos negros à espera da maldição

E só um carnaval para redimi-los.

Cumpri-los

 em sua impenetrável  ambição

PAULO TIMM é economista, professor da UNB e poeta.

DANTE MENDONÇA e BOX 32 convidam: ilha de santa catarina.sc

O SONHO DE BORGES – por jorge lescano / são paulo.sp

 

Si un hombre atravesara el Paraíso en un sueño,

y le dieran una flor como prueba de que había estado allí,

y si al despertar encontrara esa flor en su mano…

¿entonces, qué?

Samuel Taylor Coleridge,

 apud Jorge Luís Borges,

La flor de Coleridge

 

Eu tinha a certeza de que os misteriosos personagens eram anunciados durante uma entrevista das que Jorge Luís Borges concedeu a Osvaldo Ferrari e foram publicadas com o título de Diálogos pela editora Seix Barral, da Espanha. Com esta convicção fui à prateleira e com mão segura retirei o volume. Devia encontrar as páginas nas que apareciam o senhor ou a família Campbell; sabia que uma empregada ou secretária prestimosa os anunciava e reiterava sua presença em algum lugar da casa, na ante-sala, talvez na biblioteca. Nesta não, provavelmente é onde se davam os encontros entre o mestre e o entrevistador, gravador por meio.

Comecei a procurá-los no índice. Ingenuamente acreditava que os títulos poderiam me dar alguma orientação. Eu não lembrava qual era o tema tratado no caso. Confiando na intuição, pensei que relendo os títulos poderia ativar a memória e assim apressar meu encontro com o assunto procurado. Este tipo de pesquisa deu em nada, como é fácil prever. Apelei então para a memória visual.

Não é incomum reencontrar passagens de leitura ao percorrer as páginas de forma aleatória e vista panorâmica, guiado apenas pela lembrança da altura da linha e da posição da página na ordem das coisas, isto é páginas à destra ou sinistra. Novamente o resultado foi nulo. Então, já resignado a um trabalho mais minucioso, decidi encarar as 383 páginas do livro realizando algo que alguns chamam de leitura visual e que consiste em procurar palavras em negrito, em itálico ou simplesmente palavras que comecem com maiúscula. Não é necessário ser um Dupin para concluir que a letra impressa teimava em me ludibriar apesar de ter realizado a tarefa de trás para frente e em sentido inverso, e mais de uma vez, pois sabia que a citação estava ali, acaçapada mas não oculta na floresta de letras como a própria família Campbell em algum cômodo da casa. Após diversas tentativas de surpreender distraídos os escorregadios personagens, devolvi o livro à prateleira. Vi-me literalmente de mãos vazias e olhos em áscuas.

Sem dúvidas era em um livro de entrevistas e não em revista ou jornal onde havia lido o famoso nome dos Campbell. Existe na desordem de minha biblioteca algum outro volume de entrevistas?

Os djins que moram nas minhas prateleiras não só trocam os livros de lugar como, familiarizados com o ambiente e aproveitando meus lapsos de memória, vez por outra mudam a ordem dos assuntos dentro do volume e mais, transferem matérias e capítulos de um livro para outro.

Resmungando e de olhos fechados rememorei a sequência de obras que tratam de escritores: romances, contos, ensaios críticos, biografias, entrevistas. E eis que a minha memória, que já causou espanto nos amigos, mais uma vez serviu de trampolim para mergulhar no mar das belas letras.

Há na fileira de lombadas –a esta altura da crônica novamente estou de pé diante do vasto mundo do alfabeto– duas que prometem satisfazer a fome e a sede –a situação é deveras melodramática– se não do reencontro com a família Campbell, pelo menos a certeza de que a minha memória continua fiel ao seu desígnio.

Possuo os dois volumes de Os escritores, as históricas entrevistas da Paris Review, publicados pela Companhia das Letras em 1988. Peguei o primeiro volume com sofreguidão, ávido de verificar o índice dos entrevistados e ali estava ele. De pura satisfação dei um tapa na capa do livro. Devo dizer que a poeira me fez espirrar? Vá lá!, a narrativa é verídica.

Entre as páginas, uma anotação a respeito dos Campbell feita há quinze anos prova que estou no caminho certo. Mais calmo retomei –gostaria de escrever na minha poltrona preferida, infelizmente só tenho um sofá-cama e duas cadeiras desemparelhadas em minha mansarda que nem sequer foi projetada por Mansart, mas por Niemeyer e na Paulicéia desvairada–  a leitura da matéria procurando o famigerado sobrenome. E porque este relato estava no horizonte de minha procura, era imprescindível que relesse toda a entrevista para contextualizar motivo e tema, expressões com que gosto de confundir peritos em letra impressa.

O encontro acontece em julho de 1966. Partcipam da cena na sala da Direção da Biblioteca Nacional, em Buenos Aires, Jorge Luís Borges, diretor da instituição, a senhorita Susana Quinteros, secretária do diretor e o entrevistador Ronald Christ

A pequena figura do escritor apoiado na bengala, de boina e com um terno cinza pendurado no seu corpo parece ainda menor devido ao pé-direito alto da sala, típico das construções antigas. Decoram as paredes diversas águas-fortes de Piranesi. Acima da lareira há um retrato.

— Não importa. É uma reprodução de outra pintura –responde a secretária quando interrogada sobre a identidade do personagem retratado.

A ação sugere enredo teatral de sucesso, clássico e interessante triângulo amoroso: escritor célebre e idoso, secretária que por hábito cinematográfico imaginamos jovem, bela e loira, visitante alienígena que suspeitamos elegante e erudito. Contudo, o mundo nunca satisfaz todas as nossas esperanças. Milhões de pessoas jogam na mega-sena, apenas alguns felizardos levam a bolada.

No desconcerto do mundo não se deve esperar muito das personagens femininas. A senhorita Quinteros não ultrapassou as minhas expectativas.

 

Na página 207 de Diálogos lê-se:

SUSANA QUINTEROS (entrando): Desculpem-me. O sr. Campbell está esperando.

BORGES: Ah, por favor, peça-lhe que espere um momento. Bem, há um certo sr. Campbell esperando; os Campbell estão vindo.

PERGUNTA: Quando escrevia as suas histórias, o senhor as revisava muito?

            Na página 219 temos:

SUSANA QUINTEROS (interrompendo): Desculpe. Está esperando el señor  Campbell.

BORGES: Ah, por favor, peça-lhe que espere só um momento mais. Esses Campbell continuam a chegar.  

Na página 223:

PERGUNTA: E qual dos dois o senhor é?

BORGES: Penso que sou aristotélico, mas gostaria que fosse o contrário. Acho que é o sangue inglês que me faz pensar em determinadas coisas e pessoas como sendo reais, em vez das idéias gerais serem reais. Mas agora receio que os Campbell estejam vindo.

PERGUNTA: Antes que eu vá, o senhor se importaria de assinar o meu exemplar de Labyrintes?

Na página seguinte, última da entrevista, o escritor argentino comenta a pouca freqüência dos leitores norte-americanos a certos autores do seu próprio país:

PERGUNTA: Eles são lidos, mas mais nas escolas secundárias.

BORGES: E O. Henry?

PERGUNTA: Também, sobretudo nas escolas.

BORGES: E suponho que sobretudo por causa da técnica, do desfecho surpreendente. Não gosto desse truque, você gosta? Ah, funciona bem na teoria; na prática, é uma outra coisa. Você só pode lê-los uma vez, se houver apenas a surpresa. […] Agora, nas histórias de detetives, é diferente. A surpresa está lá, sim, mas há também as personagens, o cenário ou a paisagem para nos satisfazer. Mas agora me lembro de que os Campbell estão vindo. Supõe-se que sejam uma tribo muito feroz. Onde estão eles?

Expectante, Ronald Christ se empina sobre seu cóccix. A porta abre-se lentamente. Aproveitando a brecha o entrevistador se esgueira pelo sul de Buenos Aires, Labyrintes autografado no sovaco.

Borges, como se soubesse do que se trata, ou quiçá totalmente inocente pela cegueira, relaxa-se na poltrona como quem se dispõe a tirar uma soneca. Após alguns segundos irrompe na sala Andy Warhol vestido de caubói. O rosto sarapintado torna-o parecido com um dos seus múltiplos auto-retratos em serigrafia; ostenta um enorme cocar na cabeça, as abas de plumas são tão longas que alguém fora da vista sustenta-as para que não arrastem no chão.

Quando Andy Warhol chega perto da lareira, os Campbell aparecem. São latas de sopa de vários sabores, têm o tamanho de um homem e marcham em fila indiana, séquito do artista pop. Batem na barriga com grandes colheres de metal. –Em alguma página transtrocada pelos meus djins familiares Estela Canto afirma que Georgie, nos restaurantes, só tomava sopa de arroz e bebia grandes quantidades d’água.– Enquanto Andy Warhol gargareja um som contínuo, sincopado, cobrindo e descobrindo a boca com a mão, Borges, de olhos fechados, a cabeça inclinada para trás no espaldar da poltrona, sorri beatificamente. Os Campbell dançam em círculo em volta dele como se rodeassem um grande caldeirão de água fervendo. Andy Warhol faz gestos rituais sobre o cocuruto do bibliotecário e o seu próprio. Borges balança a cabeça ritmicamente. Sob os auspícios de Coleridge, banqueteia-se com sopa de letras.

O RESSURGIMENTO DA ESQUERDA – por paulo timm / portugal.pt

 

Há poucos anos era comum ouvir-se, no mundo inteiro, que as diferenças ideológicas haviam desaparecido. Um autor famoso até arriscou: “É o fim da História”. Com isso queria ele  dizer dizer que, doravante, o mundo fluiria como uma nave no espaço, sem conflitos, sem guerras, ao sabor apenas da paz e do progresso. O grande fator de desestabilização política da modernidade, o comunismo, que rondou como um fantasma a Europa na segunda metade do séculoXIX e depois converteu-se em ameaça vermelha em países como União Soviética, China ou Cuba,  sucumbira nos escombros do Muro de Berlim, em 1989. Quem dera…!!! Nem 20 anos se passara e a Crise Econômica de 2008, nos Estados Unidos, reacenderia todo o debate de novo. Até o velho Profeta do socialismo moderno, Karl Marx, saiu das bibliotecas e começou , de novo, a povoar análises e prognósticos. E não só como inspiração, mas como doutrina ortodoxa.  Os primeiros sinais deste revival veio da América Latina. Chavez reinventou Bolívar como ideólogo de um novo tipo de socialismo, inspirando correntes e lideranças em vários países: Bolívia, Equador, alguns outros. Lula subiu ao poder em 2003, no Brasil, e fez Dilma sua sucessora. Os Kirchner reacenderam a fé e esperança peronista na Argentina, também no início da década passada e lá continuam, mesmo enfrentando panelaços de descontentamento social.  Mas a esquerda não cresceu apenas do lado de baixo do Equador. Nos Estados Unidos, Barack Obama, que é um liberal de esquerda, negro,  com vínculos com movimentos sociais, ganhou as eleições em 2008 e reelegeu-se, agora , de novo, enfrentando sérias acusações de seu oponente de que não só é socialista, como mantém vínculos com Fidel, Chavez e Lula… E a Europa, castigada pelo repique da crise financeira americana,  segue o curso. Elegeu, há pouco um novo Presidente da França, F. Hollande, do Partido Socialista e criou, com isso, uma nova polarização em todo o continente. Dentro de pouco tempo Espanha e Portugal devem , também, enfrentar eleições e tudo indica o retorno da esquerda ao Poder nesses países.  Enfim, a História revive em seu clássico confronto de idéias e interesses.

Mas, o que vem a ser exatamente o confronto esquerda x direita e , em que medida, se pode falar, hoje, numa “Nova Esquerda”?

Não há , aqui, espaço para grandes considerações filosóficas. Sejamos, pois, breves.

Há uma Lei Geral no Universo, sobre a qual não há controvérsias: a do Movimento. “E, no entanto, se move”, teria dito, entredentes, Galileu, ao enfrentar o Tribunal de Inquisição da Igreja de Roma, para o qual o mundo era estático, com a Terra no centro do sistema solar. Heráclito, filósofo grego, das calendas  clássicas, já havia advertido: “Tudo flui”.  Pode-se, até, discutir quem deu o pontapé inicial, mas, isso posto, o mundo gira e se expande. Não há ordem, neste processo. Reina a mais sublime anarquia, na qual resultam choques de estrelas e até Galáxias inteiras, num frenesi tão impressionante quanto sinistro. Enquanto isto, em outras partes do Universo, reina paz celestial. Graças a ela, deste lado do sol, estamos vivendo nosso doce e bela vida, embora expulsos do Paraíso e sujeitos ao suor para ganhar o pão de cada dia.

Criamo-nos, pois, e multiplicamo-nos, sobre a delicada pele do planeta que habitamos.  Constituímos sociedades, das primitivas às complexas; desenvolvemos crenças, instituições, uma cultura invejável; formamos, a partir de hordas e tribos, grandes Impérios Teocráticos, que deram lugar aos modernos regimes constitucionais ; e dominamos, como o conhecimento, a natureza, até castigá-la com o excesso de gentes e seus artefatos e rejeitos. Mas, como somos feitos da mesma matéria que as estrelas, tudo isto também ocorreu em meio à tormentos humanos, com flagelos de toda ordem. No início predominou nas sociedades a lei natural do mais fortes. E eles eram “escolhidos” pelas mulheres para formar suas proles. Criavam-se , assim, famílias poderosas, com grande capacidade de  impor sua vontade aos demais, daí resultando inevitáveis entrechoques de vontades. Era o começo da História. E da Política, pois o homem é um animal social que interage para viver e se reproduzir, jamais abdicando destes imperativos. E o faz “naturalmente”, sem qualquer recurso intelectual, como um pássaro, uma flor ou um dinossauro. Mas neste processo de se reproduzir em sociedade acabou substituindo a força pela Lei, de forma a reduzir a violência da dominação e a guerra de todos contra todos. Com isto “desnaturalizou” o seu próprio mundo. Fê-lo humano… E assim chegamos ao Estado Moderno, que necessita da força para se impor, por delegação pactuada de seus súditos, mas que subordina a força à Lei para se legitimar. E a Lei é para Todos, não só para os mais fortes, que no curso de seu poder acumulam privilégios, ou os transferem a grupos sociais sob seu estrito controle. Ou ainda cristalizam preconceitos, convenções discriminatórias e instituições em benefício próprio.  E desta forma emergem idéias divergentes sobre o conteúdo da Lei e sua abrangência como forma civilizada do ser social. Aqueles que se acham confortáveis numa situação histórica qualquer, serão conservadores, resistindo às mudanças que lhe poderão tolher benefícios. Os que se sentem desconfortáveis, perseguirão  mudanças.  E enquanto houver sociedade, haverá sempre este conflito, que levado ao extremo poderá gerar à exaltações como golpes “reacionários” e revoluções sangrentas. E aqui, a atualidade da esquerda contemporânea: Talvez tenha compreendido que melhor ir devagar com o andor, porque o santo é de barro…E que a utopia serve mais como uma bússola a indicar o caminho do que como paradigma de chegada. Mas não abdicará jamais de seu papel no fazer histórico, que é, fundamentalmente, a luta pela maior igualdade entre os homens que cultivam e almejam um mundo livre. Livre da fome, livre das diferenças , livre dos preconceitos…

PAULO TIMM é economista, professor da UNB e técnico em planejamento.

A ESTRANHA FIGURA DO ANALISTA POLÍTICO – por luis fernando pereira / curitiba.pr

O analista político é uma figura estranhíssima. Quase sempre tudo sabe sobre comportamento do eleitor; quase nunca sabe antes de ter acontecido. É invariavelmente um engenheiro de obra feita, para usar uma expressão bem ao gosto de FHC. Simulam perfeição em diagnósticos, mas são sempre péssimos em prognósticos. Em campanhas eleitorais são todos (eu disse todos) reféns da última pesquisa publicada. Com os números em mãos, lá está o analista político a explicar ao pobre diabo do eleitor-leitor-telespectador-ouvinte porque teria havido a subida daquele candidato e a descida do outro. Com uma linguagem generalizante e subjetiva (similar à linguagem de horóscopo) explicam, em detalhes que parecem óbvios, o porquê de tudo. Sabem impressionar.

A eleição no primeiro turno aqui em Curitiba pregou uma peça em alguns videntes do acontecido. Minutos depois de encerrada a votação, Ibope divulgou pesquisa com diferença de cinco pontos entre Luciano Ducci e Gustavo Fruet – que disputavam vaga para acompanhar Ratinho na disputa de segundo turno. Acreditando na pesquisa (eu também acredito e acreditei, advirto), todos os analistas de popular canal de TV passaram imediatamente a explicar aos neófitos (como são tratados os telespectadores) as óbvias razões pelas quais Gustavo não tinha ido ao segundo turno. A explicação foi complexa e exaustiva, de forma tal a classificar como estúpido o simples cogitar de uma vitória de Gustavo Fruet. O candidato do PDT teria errado desde o início ao aliar-se ao PT. A campanha foi toda sem rumo. Os ministros Paulo Bernardo e Gleisi Hoffmann eram os grandes perdedores, pois tinham sido incompetentes na condução da campanha. E mais tantos outros argumentos científicos. Tão científicos quanto feng shui, para citar um bom chiste de Ivan Lessa (minhas homenagens ao Ivan Lessa, morto em 2012).

Nossos analistas não contavam com a surpresa. O Ibope tinha errado a pesquisa de boca de urna. Gustavo foi ao segundo turno, por pequena margem. Constrangimento geral no estúdio. Mas por pouco tempo. Não demorou para que nossos ilustres analistas políticos já tivessem outra explicação completamente diferente para elucidar as, também óbvias, razões pelas quais Luciano Ducci havia ficado fora do segundo turno. E assim foram “analisando” (notem as aspas) os demais resultados eleitorais, sempre com o mesmo semblante de quem entende das coisas. Mais do que constrangedor, foi engraçado.

Que me perdoe Paulo Bonavides, mas política não é ciência. E mesmo que seja, o diabo é que tem o homem como variável. Com isso saímos do campo das ciências mais rígidas. O imponderável ocupa um espaço muito grande para autorizar previsões. Dia desses Hélio Schwartsman citou na Folha de S. Paulo estudo de Philip Tetlock. Segundo Schwartsman, Tetlock (de quem eu nunca tinha ouvido falar) coletou durante 20 anos cerca de 28.000 previsões acerca da economia e de eventos políticos feitas por 284 experts em diversos campos e de diversas orientações políticas. A conclusão básica é que eles se saíram milimetricamente melhor do que o acaso. Repito: milimetricamente melhor do que o acaso! Noutras palavras: previsão em política é pouco mais do que palpite.

Façam vocês mesmos uma pequena experiência ao estilo de Tetlock. Peguem as análises políticas no pós-pesquisa de qualquer eleição municipal deste ano. Escolha os casos de maiores variações nos índices de popularidade. Compare as diferentes análises e projeções dos analistas no período da campanha. Tudo se altera na medida exata do novo cenário revelado pela pesquisa mais recente. A explicação é sempre científica, como se fosse um cálculo estequiométrico entre diferentes compostos (exemplo de Schwartsman). Nada disso. É pura engenharia de obra feita.

Na política o imponderável ocupa um espaço infinitamente maior do que admitem os analistas políticos. E por que, afinal, os tais analistas não confessam logo que previsão em campanha eleitoral é pouco mais do que palpite? Ora, isso significaria diminuir a importância da própria profissão. E é claro que não podemos exigir dos analistas políticos um suicídio profissional coletivo. A propósito, os analistas políticos têm um protocolo silencioso. Jamais criticar previsão equivocada de outro analista. Esprit de corps, como dizem os franceses.

O comportamento humano é caótico. Mínimas alterações numa variável, explica Schwartsman, podem modificar dramaticamente os resultados. Previsões em campanhas eleitorais estão no campo da adivinhação. Ao abordar o passado nossos analistas políticos são perfeitos. Quando quisessem falar sobre prognósticos deveriam usar turbantes de vidente. Seria mais sincero.

 

LUIS FERNANDO PEREIRA é advogado doutor em direito, professor e escritor.

ESCREVER À MÃO é um hábito em declínio – por marcelo gonzatto – porto alegre.rs

Escrever à mão é um hábito em declínio PDF Imprimir E-mail
12-NOV-2012

Pesquisador diz que escrever a punho continuará a ter um papel decrescente na escola se cada criança tiver um computador

O declínio do hábito de escrever à mão, provocado pelo avanço da tecnologia digital, despertou um debate sobre que tipo de tecnologia deve prevalecer nas escolas: a velha caneta ou os novos teclados.

Apesar da ofensiva crescente dos computadores, tablets e smartphones sobre o cotidiano, estudos científicos vêm apontando que escrever à mão produz efeitos no cérebro e no aprendizado diferentes daqueles provocados pela digitação.

— Escrever à mão continuará a ter um papel decrescente na escola se cada criança tiver um computador. Nas casas onde há computador, isso já aconteceu — sustenta um dos principais especialistas mundiais no assunto, o pesquisador americano e professor da Universidade do Estado do Arizona Steve Graham.

Nos Estados Unidos, o ensino do estilo cursivo deixou de ser obrigatório na maioria dos Estados — o que desperta temores de que futuras gerações não consigam ler documentos históricos. Para Graham, o desafio atual é que “seja escrevendo à mão ou teclando, os estudantes precisam ser fluentes com ambos”. No Rio Grande do Sul, conforme o presidente do Sindicato do Ensino Privado (Sinepe/RS), Osvino Toillier, as escolas começam a revalorizar as redações manuscritas:

— Antigamente, não se aceitava trabalho feito com garrancho. Acho que a escola descuidou um pouco disso. Em certo momento, entrou em um fascínio tecnológico em que o importante era ter computador. O pêndulo foi de um lado para o outro, e acho que agora devemos nos situar em uma posição intermediária.

Razões para fazer isso vem sendo sugeridas por estudos recentes, segundo os quais o ato de desenhar uma letra à mão cria uma espécie de “memória muscular” que facilita o posterior reconhecimento do alfabeto, e desencadeia no cérebro reações diferentes de teclar (leia entrevista na página ao lado). Um estudo feito na Universidade Internacional da Flórida demonstrou que escrever bem à mão está relacionado com um melhor desempenho em leitura e matemática.

Mas o uso da tecnologia também traz vantagens. Conforme a pedagoga Patrícia Camini, mestre em Educação e professora da rede municipal de Porto Alegre, suportes digitais ajudam as crianças em áreas como pontuação e acentuação. A solução é encontrar tempo e espaço para as duas formas de escrita.

— O que tem ocorrido nas escolas é ou um descaso com o investimento na legibilidade da escrita dos alunos ou um apego ferrenho às práticas antigas de caligrafia como única opção a isso. Ainda precisamos alcançar um equilíbrio — avalia.

A necessidade de redigir à mão em provas como a do Enem também ajuda a resgatar a importância de lápis e canetas. A estudante do 3º ano do Ensino Médio Daniela Casaril, 17 anos, exercita a caligrafia regularmente. Mesmo sem o rigor das aulas da época do pai, Sérgio Casaril, considera fundamental saber se expressar de próprio punho:

— Tenho colegas que não dá para entender o que escrevem. É importante saber escrever à mão.

Projeto escolar estimula crianças a trocar cartas


Em colégio da Capital (POA), alunos da 6ª série trocam correspondências
Foto: Fernando Gomes, Agência RBS

Em plena era digital, as cartas manuscritas voltaram a ser utilizadas por crianças da Capital. Não para manter contato com amigos ou parentes distantes, mas com fins pedagógicos. Um projeto do Colégio Marista Assunção, na Capital, estimula os alunos de três turmas de 6ª série do Ensino Fundamental a trocarem correspondências entre si ao longo do ano. As folhas preenchidas à mão, com direito a envelope, são recolhidas pela professora, reunidas em uma caixa, e periodicamente entregues aos seus destinatários.

Graças ao correio escolar coordenado pela professora Ana Lúcia Furtado, estudantes como Mariana Remião, 11 anos, e Eduardo Severini, 12, experimentam a antiga prática de enviar um texto sem resposta imediata — diferentemente de ferramentas eletrônicas como e-mail ou mensagens de celular. Além disso, procuram caprichar na caligrafia para serem compreendidos e evitam as abreviações comuns na internet.

— A minha letra até melhorou depois que começamos a fazer as cartas. Hoje prefiro escrever à mão do que usar o teclado — conta Mariana.

Eduardo, que costuma utilizar Facebook e MSN, também gostou da experiência:

— A gente treina a escrita e procura se expressar melhor.

A professora explica que os estudantes são orientados a escrever sobre determinados temas, como sugestões de livros, e por vezes escolhem quem vai receber o texto. Outras vezes, o destinatário é determinado arbitrariamente.

— Assim, garantimos que ninguém fique sem receber uma carta — explica.

Para aumentar a familiaridade dos alunos do século 21 com as cartas, leram livros escritos no formato de troca de correspondência.

A CULTURA DA POLÍTICA CULTURAL – por almandrade / salvador.ba

Razão em Coma

 

Pobres bibliotecas vazias
sem títulos e sem Borges,
O tempo, indiferente
ao jogo dos relógios,
não é mais dos livros.
O saber é um desconforto
de uma civilização
que vive ao redor do imediato
e humilha a memória.

(do livro MALABARISMO DAS PEDRAS  Almandrade – poemas,  edições MAC – Feira de Santana -Ba. 2010)

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Entre a falta de reflexão, de crítica e o medo que passou a fazer parte da vida do brasileiro, a constatação de um desenvolvimento determinado pelas variantes econômicas, longe de um projeto orientado por uma política cultural. O crescimento econômico, sem levar em conta as vertentes culturais, não é suficiente para promover  a melhoria das condições materiais de sobrevivência. Não é a meta de mais recursos para a cultura que está em jogo, mas a participação da cultura na opção do modelo de desenvolvimento. Medidas de aquecimento da economia são tomadas sem um relatório do impacto sócio-cultural. A cultura é sempre o acessório. A quantidade, e não a qualidade, emprego e renda são levados em conta nos diferentes projetos políticos que têm o mesmo objetivo garantir o consumo e o espetáculo da vida moderna. A cultura não é nem a toalha da mesa onde se negocia sobre os  investimentos e o destino do País, do Estado e da cidade.

Por outro lado, o que é refletido e produzido no que diz respeito ao sentido da cultura, no meio de arte, é muito pouco e chega a ser mesquinho para uma política mais ampla, as discussões se concentram em torno de reivindicações particulares. Estamos limitados à escala individual de nossas corporações, sem capacidade para pensarmos nas necessidade sociais e culturais globais, que vão além de nossas atividades profissionais. Precisamos de algo mais que uma bolsa de arte, uma salão de arte, editais que pouco contribuem para a formação do artista e do público e a proteção dos bens móveis e imóveis, materiais e os chamados imateriais, enfim; uma perspectiva menos assistencialista por parte do Estado.

O Estado tem que admitir que tem responsabilidade na área cultural com ações efetivas. Criar  uma equipe especializada com reflexão sólida e capacidade de formular, articular e por em prática iniciativas que não se restrinjam somente a repasse de recursos através de editais, nem sempre acessíveis aos melhores projetos. Com esse programa de atendimento a demandas de  proponentes, o Estado acaba   encobrindo problemas, disfarçando e transferindo responsabilidades para  produtores independentes de eventos, muitas vezes com outros interesses.

A instituição cultural pública não é um simples lugar de apresentação de eventos e espetáculos, mas principalmente o lugar de estimular e provocar o pensamento. Um museu de arte, por exemplo, precisa de uma dotação orçamentária para garantir uma programação e a formação de uma coleção, que devem ser orientadas por um corpo curatorial, livre  de interesses pessoais e compromissos outros que comprometam a política e a importância dos bens culturais e o papel formativo da instituição.

Além desse modelo de distribuição de recursos em nome da transparência, com o outro da renúncia fiscal para financiar a cultura, o Estado banca mediatizado pela iniciativa privada o evento cultural que  veicula  as marcas das empresas “patrocinadoras”.  Museus e outras instituições  passam a ser casas de hospedaria de eventos, exposições, espetáculos e entretenimentos e deixam de exercer suas funções de promover enunciados críticos. A programação e a construção de seu acervo fica à mercê de apoio pontual. O que define a pauta é a garantia de patrocínio e não a qualidade do que deve ser mostrado, comprometendo a liberdade, a sustentabilidade e a função da instituição.

Sem falar nos centros culturais privados criados às custas da isenção  fiscal que concorrem de forma privilegiada com instituições públicas de peso histórico. Com mais recursos, eles fazem uma política paralela sem maiores responsabilidades, além de associar suas marcas em produtos culturais que tenham visibilidade na mídia, com algumas raras exceções.

Almandrade

(artista plástico, poeta e arquiteto, integrante do Conselho de Cultura do Estado da Bahia)

PAULINHO DA VIOLA completa 70 anos hoje – por zuleika dos reis / são paulo.sp

ANIVERSÁRIO DE PAULINHO DA VIOLA

                                                         

 

Paulo César Batista de Faria, nosso Paulinho da Viola. Poeta, príncipe, rei, mestre do samba, venho saudar-te, humildemente, por toda a beleza que sempre nos trouxeste a todos; venho para saudar-te neste dia 12 de novembro de 2012, quando completas 70 anos.

Ah! “Foi um rio que passou em minha vida”: Portela querida; “Coisas do mundo, minha nega”: sempre as coisas do mundo, meu nego; “Sinal Fechado”: de quantos sinais fechados se tecem as múltiplas vidas! Os nomes de tuas obras-primas poderiam continuar a ser aqui citados… ah… poderiam… por muitas linhas e linhas…

Paulinho da Viola e a Velha Guarda da Portela. Paulinho da Viola e dos azuis sem fim, e das rodas de samba sem fim… e da saudade dos sambas partilhados, compartilhados… tantos sambas… tantos…

Paulinho da Viola, artesão, em sua oficina, em casa, a fabricar com as mãos tão hábeis, instrumentos musicais.  Paulinho da Viola, a tocar junto com o filho e com o pai César de Faria, grande músico do conjunto Época de Ouro. Paulinho da Viola, presença ímpar nos mais autênticos pagodes da Música Popular Brasileira; Paulinho da Viola, de tempos mais limpos e mais felizes, de tempos de Outras Esperanças para este país do futuro.

Paulinho da Viola, em cuja voz e sambas ecoam muitas saudades infinitas de mim mesma. Ave, Paulinho da Viola, poeta, príncipe, rei, mestre do samba, cantor dos sentimentos mais fundos e autênticos da alma do povo brasileiro.  Com minha hoje tão parca voz venho saudar-te, neste 12 de novembro de 2012, saudar os teus 70 anos, saudar-te a ti que não tens idade, eterno que és. Por tudo o que representas e sempre representarás na nossa história musical venho saudar-te, com o abraço mais fundo do meu coração. Esta fã desconhecida de Sampa, esta fã que já cantou músicas tuas, esta para sempre anônima de si mesma, mas com palavra ainda para saudar-te. Ainda. A ti, patrimônio musical do Brasil: Paulo César Batista de Faria: Paulinho da Viola. Feliz aniversário.

 

Min. Joaquim Barbosa, o sonho, dele, pode virar pesadelo – ramatis jacino / são paulo.sp

 

Negros que escravizam e vendem negros na África, não são meus irmãos
Negros senhores na América a serviço do capital, não são meus irmãos
Negros opressores, em qualquer parte do mundo, não são meus irmãos…
Solano Trindade


O racismo, adotado pelas oligarquias brasileiras para justificar a exclusão dos negros no período de transição do modo de produção escravista para o modo de produção capitalista, foi introjetado pelos trabalhadores europeus e seus descendentes, que aqui aportaram beneficiados pelo projeto de branqueamento da população brasileira, gestado por aquelas elites.

Impediu-se, assim, alianças do proletariado europeu com os históricos produtores da riqueza nacional, mantendo-os com ações e organizações paralelas, sem diálogos e estratégias de combate ao inimigo comum. Contudo, não há como negar que o conjunto de organizações sindicais, populares e partidárias, além das elaborações teóricas classificadas como “de esquerda”, sejam aliadas naturais dos homens e mulheres negros, na sua luta contra o racismo, a discriminação e a marginalização a que foram relegados.
No campo oposto do esp ectro ideológico e social, as organizações patronais, seus partidos políticos e as teorias que defendem a exploração do homem pelo homem, que classificamos de “direita”, se baseiam na manutenção de uma sociedade estamental e na justificativa da escravidão negra, como decorrência “natural” da relação estabelecida entre os “civilizados e culturalmente superiores europeus” e os “selvagens africanos”.

É equivocada, portanto, a frase de uma brilhante e respeitada filósofa negra paulistana de que “entre direita e esquerda, eu sou preta”, uma vez que coloca no mesmo patamar os interesses de quem pretende concentrar a riqueza e poder e àqueles que sonham em distribuí-la e democratizá-la. Afirmação esta, que pressupõe alienação da população negra em relação às disputas políticas e ideológicas, como se suas demandas tivessem uma singularidade tal que estariam à margem das conce pções econômicas, de organização social, po líticas e culturais, que os conceitos de direita e esquerda carregam.

As elites brasileiras sempre utilizaram indivíduos ou grupos, oriundos dos segmentos oprimidos para reprimir os demais e mantê-los sob controle. Capitães de mato negros que caçavam seus irmãos fugidos, capoeiristas pagos para atacarem terreiros de candomblé, incorporação de grande quantidade de jovens negros nas polícias e forças armadas, convocação para combater rebeliões, como a de Canudos e Contestado, são exemplos da utilização de negros contra negros ao longo da nossa história.

Havia entre eles quem acreditasse ter conquistado de maneira individual o espaço que, coletivamente, era negado para o seu povo, iludindo-se com a idéia de que estaria sendo aceito e incluído naquela sociedade. Ansiosos pela suposta aceitação, sentiam necessidade de se mostrarem confiáveis, cumprindo a risca o que se esperava deles, radicalizando nas ações, na defesa dos valores d os poderosos e da ideologia do “establishment” com mais vigor e paixão do que os próprios membros das elites. A tragédia, para estes indivíduos – de ontem e de hoje -, se estabelece quando, depois de cumprida a função para a qual foram cooptados são devolvidos à mesma exclusão e subalternidade social dos seus irmãos.

São inúmeros os exemplos deste descarte e o mais notório é a história de Celso Pitta, eleito prefeito da maior cidade do país, apoiado pelos setores reacionários, com a tarefa de implementar sua política excludente.

Depois de alçado aos céus, derrotando uma candidata de esquerda que, quando prefeita privilegiou a população mais pobre – portanto, negra – foi atirado ao inferno por aqueles que anteriormente apoiaram sua candidatura e sua administração. Execrado pela mídia que ajudou a elegê-lo, a bandonado por seus padrinhos políticos, acabou processado e preso, de forma

humilhante, de pijama, al gemado em frente às câmeras de televisão. Morreu no ostracismo, sepultado física e politicamente, levando consigo as ilusões daqueles que consideram que a questão racial passa ao largo das opções político/ideológicas.

A esquerda, por suas origens e compromissos, em que pese o fato de existirem pessoas racistas que se auto intitulam de esquerda, comporta-se de maneira diversa: foi um governo de esquerda que nomeou cinco ministros de Estado negros; promulgou a lei 10.639, que inclui a história da África e dos negros brasileiros nos currículos escolares; criou cotas em universidades públicas; titulou terras de comunidades quilombolas e aprofundou relações diplomáticas, econômicas e culturais com o continente africano.

Joaquim Barbosa se tornou o primeiro ministro negro do STF como decorrência do extraordinário currículo profissional e acadêmico, da sua carreira e bela história de superação pessoal. Todavia, jamais teria se tornado ministro se o Brasil não tivesse eleito, em 2003, um Presidente da República convicto que a composição da Suprema Corte precisaria representar a mistura étnica do povo brasileiro.

Com certeza, desde a proclamação da República e reestruturação do STF, existiram centenas, talvez milhares de homens e mulheres negras com currículo e história tão ou mais brilhantes do que a do ministro Barbosa.

Contudo, nunca passou pela cabeça dos presidentes da República – todos oriundos ou a serviço das oligarquias herdeiras do escravismo – a possibilidade de indicar um jurista negro para aquela Corte. Foi necessário um governo de esquerda, com todos os compromissos inerentes à esquerda verdadeira, para que seu mérito fosse reconhecido.

A despeito disso, o ministro Barbosa, em uníssono com o Procurador Geral da República, considera não haver necessidade de provas para condenar os réus da Ação Penal 470. Solidariza-se com as posiçõ es conservadoras e evidentemente ideológicas de alguns dos demais ministros e, em diversas ocasiões procura ser “mais realista do que o próprio rei”.

Cumpre exatamente o roteiro escrito pela grande mídia ao optar por condenar não uma prática criminosa, mas um partido e um governo de esquerda em um julgamento escandalosamente político, que despreza a presunção de inocência dos réus, do instituto do contraditório e a falta de provas, como explicitamente já manifestaram mais de um dos integrantes daquela Corte.

Por causa “desses serviços prestados” é alçado aos céus pela mesma mídia que, faz uma década, milita contra todas as iniciativas promotoras da inclusão social protagonizadas por aq uele governo, inclusive e principalmente, àquelas que tentam reparar as conseqüências de 350 anos de escravidão e mais de um século de discriminação racial no nosso país.

O ministro vive agora o sonho da inclusão plena, do po der de fato, da capacidade de fazer valer a sua vontade. Vive o sonho da aceitação total e do consenso pátrio, pois foi transformado pela mídia em um semideus, que “brandindo o cajado da lei, pune os poderosos”.

Não há como saber se a maximização do sonho do ministro Joaquim Barbosa é entrar para a história como um juiz implacável, como o mais duro presidente do STF ou como o primeiro presidente da República negro, como já alardeiam, nas redes sociais e conversas informais, alguns ingênuos, apressados e “desideologizados” militantes do movimento negro.

O fato é que o seu sonho é curto e a duração não ultrapassará a quantidade de tempo que as elites considerarem necessário para desconstruir um governo e um ex-presidente que lhes incomoda profundamente.

Elaborar o maior programa de transferência de renda do mundo, construir mais de um milhão de moradias populares, criar 15 milhões de empregos, quase triplicar o s alário mínimo e incluir no mercado de consumo 40 milhões de pessoas, que segundo pesquisas recentes é composto de 80% de negros, é imperdoável para os herdeiros da Casa Grande. Contar com um ministro negro no Supremo Tribunal Federal para promover a condenação daquele governo é a solução ideal para as elites, que tentam transformá-lo em instrumento para alcançarem seus objetivos.

O sonho de Joaquim Barbosa e a obsessão em demonstrar que incorporou, na íntegra, as bases ideológicas conservadoras daquele tribunal e dos setores da sociedade que ainda detém o “poder por trás do poder” está levando-o a atropelar regras básica s do direito, em consonância com os demais ministros, comprometidos com a manutenção de uma sociedade excludente, onde a Justiça é aplicada de maneira discricionária.

A aproximação com estes setores e o distanciamento dos segmentos a quem sua presença no Supremo orgulha e serve de exemplo, contribuirão p ara transformar seu sonho em pesadelo, quando àqueles que o promoveram à condição de herói protagonizarem sua queda, no momento que não for mais útil aos interesses dos defensores do “apartheid social e étnico” que ainda persiste no país.

Certamente não encontrará apoio e solidariedade nos meios de esquerda, que são a origem e razão de ser daquele que, na Presidência da República, homologou sua justa ascensão à instância máxima do Poder Judiciário. Dos trabalhadores das fábricas e dos campos, dos moradores das periferias e dos rincões do norte e nordeste, das mulheres e da juventude, di retamente beneficiados pelas políticas do governo que agora é atingido injustamente pela postura draconiana do ministro, não receberá o apoio e o axé que todos nós negros – sem exceção – necessitamos para sobreviver nessa sociedade marcadamente racista.

Ramatis Jacino é professor, mestre e doutorando em História Econômica pel a USP e  presidente do INSPIR – Instituto Sindical Interamericano pela Igualdade Racial.

SOU RAIZ – de cora coralina / goiania.go

SOU RAIZ      –     CORA CORALINA

 

 

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Sou raiz, e vou caminhando

sobre as minhas raízes tribais.

Velhas jardineiras do passado …

Condutores e cobradores, vós me levastes de mistura

com os pequenos e iletrados, pobres e remendados …

Destes-me o nível dos humildes em tantas lições de vida.

Passante das estradas rodageiras, boiadeiros e comissários,

aqui fala a velha rapsoda.

Escuto na distância o sonido augusto do berrante que marca

o compasso das manadas que vão pelas estradas.

O mugido, o berro, o chamado da querência, a aguada,

o barreiro salitrado, a solta, o curral, a porteira,

a tronqueira, o cocho, o moirão, a salga, o ferro de marcar,

rubro, esbraseado. A castração impiedosa.

Eu sou a gleba e nada mais pretendo ser.

Mulher primária, roceira, operária, afeita à cozinha,

ao curral, ao coalho, ao barreleiro, ao tacho.

Seguro sempre nas mãos cansadas a velha candeia

de azeite veletudinária e vitalícia do passado.

Viajei nas velhas e valentes jardineiras

do interior roceiro, suas estradas de terra,

lameiros e atoleiros, seus heróicos e anônimos condutores

e cobradores, práticos, sabidos daqueles motores desgastados,

molas e lataria rangentes.

Santos milagreiros eram eles. Onde estarão?

Viajei de par com os humildes que tanto me ensinaram.

Viajantes das velhas jardineiras, meus vizinhos

das estradas viaje iras …

Meus trabalhadores: Manoel Rosa, José Dias, Paulo, Manoel,

João, Mato Grosso, plantadores e enxadeiros, meus vizinhos sitiantes,

onde andarão eles?

Andradina, Castilho, Jaboticabal, comissários e boiadeiros, tangerinos,

esta página é toda de vocês.

Fala de longe a velha rapsoda.

“O palhaço não sou eu, mas sim esta sociedade monstruosamente cínica e tão ingenuamente inconsciente que joga o jogo da seriedade para melhor esconder a loucura.” SALVADOR DALI (Salvador Domingo Felipe Jacinto Dali e Domènech – Marquês de Dali de Púbol – Figueres, Catalunha, 11 de Maio de 1904 — Figueres, 23 de Janeiro 1989.

 

A ÚLTIMA CEIA  –  THE LAST SUPPER  –   de SALVADOR  DALÍ.

GRANDE “IMPRENSA” brasileira prepara, juntamente com os partidos de aluguel – PPS, DEMo e PSDB – UMA “DENÚNCIA” contra LULA baseada em “NOVAS DENÚNCIAS” do operador dos tucanos em MINAS GERAIS marcos valério! eles estão inconformados com o BRASIL superando a crise financeira sem eles estarem ganhando com isso! mesmo assim, muitos estão, mas querem “acabar” com o LÍDER POPULAR.

MÍDIA PREPARA BOTE CONTRA LULA
Por Altamiro Borges
Há quem afirme que o julgamento do chamado “mensalão do PT” deve deixar os holofotes da mídia. Afinal, ele já teria cumprido o seu objetivo de evitar uma derrota ainda mais acachapante da oposição demotucana nas eleições de outubro. Não concordo. O julgamento midiático no STF tinha dois objetivos: um imediato, tático, eleitoral. Outro mais estratégico, visando desmoralizar as forças de esquerda. Para atingir este segundo objetivo, o ex-presidente Lula, como principal referência das esquerdas, precisa ser abatido.
Delação premiada de Valério
Nesta semana, a mídia “privada” já deu mostras que prepara o bote contra o Lula. Ela não está satisfeita apenas com a condenação e o “fuzilamento” de José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares. Hoje o Estadão estampou em sua capa que o publicitário Marcos Valério prestou um depoimento ao sinistro procurador-geral da República, Roberto Gurgel, acusando o ex-presidente e o ex-ministro Antonio Palocci de envolvimento no esquema do “mensalão”. Ele teria pedido “delação premiada” para confirmar as suas “denúncias”’.
“Valério informou que tem o que dizer. Em troca de proteção, ele se dispõe a colaborar. Tomado pelos nomes que levou à mesa, o provedor das arcas do mensalão é portador de segredos insondáveis. Citou Lula e o ex-ministro Antonio Palocci, dois nomes que não constam do processo sob julgamento no STF… Informou que foi ameaçado de morte. E insinuou que dispõe de informações sobre outro caso: o assassinato do ex-prefeito petista de Santo André, Celso Daniel, em 2002”, descreve, excitado, Josias de Souza, da Folha.
PSDB, DEM e PPS exigem “apuração”
Ontem, o mesmo Estadão – que declarou em editorial seu apoio ao tucano José Serra e, num outro editorial, lamentou a popularidade de Lula ao eleger Fernando Haddad em São Paulo – publicou entrevista com Clara Becker, ex-esposa de José Dirceu e mãe do deputado Zeca Dirceu (PT-PR). Abatida, ela teme pela prisão do ex-marido, garante que “Dirceu não é ladrão” e afirma que o ex-ministro sempre agiu em defesa do “projeto do Lula, que mudou o Brasil em 12 anos”. A estranha entrevista é utilizada, lógico, para incriminar Lula.
Esta nova onda midiática já começa a produzir os seus frutos políticos. Nesta semana, PSDB, DEM e PPS – que são pautados pela mídia – solicitaram oficialmente ao procurador-geral da República que o ex-presidente seja investigado. “É público e notório que, à época dos fatos, existia uma íntima ligação política e pessoal entre o representado [Lula] e o ex-ministro José Dirceu”, afirma o documento, assinado por Alberto Goldman, presidente em exercício do PSDB, Agripino Maia, do DEM, e Roberto Freire, do PPS.
A oposição demotucana, que encolheu em número de prefeitos e vereadores nas eleições de outubro, vai partir para a desforra. Ela pede a imediata abertura de uma nova ação penal, já que o Ministério Público havia rejeitado outra solicitação com o mesmo intento golpista. Alega que agora “há novos elementos” que exigem “profunda” investigação, sempre tendo como base artigos e “reporcagens” da mídia demotucana. Ou seja: as condenações de Dirceu, Genoino e Delúbio não encerram a guerra. E Dilma que se cuide! Ela também está na lista.

2057. UMA CRÔNICA MARCIANA – por arnaldo barbosa brandão / brasilia.df

“Vem cá Brasília, deixa eu ler tua mão menina, 
tem grande destino reservado pra você”.
Adaptação do samba do Zé Catimba (carnaval de 1974)

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Logo que cheguei a Marte em 2055 tive que responder a uma pergunta que me deixou encafifado: onde anda o Edgar? Perguntou-me um escritor marciano. Não dei muito papo, porque escritores, sabem como são, gostam de conversar fiado e metem o focinho em tudo, preferi marcar um café mais tarde no meu bangalô. Diz ele que vai processar o Edgar, como nunca li o tal Edgar, pensei, por que será? Deve ter sido briguinha de intelectuais ou alguma criticazinha a Marte. Os marcianos são tão bairristas quanto os brasilienses, eles acham Marte o suprassumo do Sistema Solar, eu acho isto aqui uma merda, sem falar que não tem praia, se bem que, como trabalho pro Itamarati, moro perto do Mare Sirenum (um lago artificial criado pras elites daqui), bem próximo ao “Monte Olimpo”, com seus 26 km de altura. Em Marte é assim, ou você está por cima, nos píncaros, é um DAS-8, ou vai morar nas ‘Fossas Marianas’, para além da “Cratera do Schiaparelli”, na periferia da periferia, e leva horas no metrô para chegar ao batente. Nos últimos anos, dizem que Marte mudou, falam em tempestades solares, mau-olhado, macumba, poluição. Há os que culpam os alienígenas, dizem que tudo começou a dar errado depois que nós chegamos, que Marte era uma tranquilidade, um sossego, com os alienígenas veio a violência, a poluição, os ventos mudaram de direção, e os morros começaram a desmoronar na periferia, é claro. O “trágico acidente”, como diz o telão, foi para os lados da “Terra de Malboro”, onde a poeira vermelha sobe em redemoinhos gigantes, porque em Marte tudo é gigantesco, tudo é super, tudo é mais bonito, mais espetacular, mais trágico. O acidente foi por volta de meia noite, acordando muitos moradores de seus sonhos freudianos, os desejos reprimidos de sempre: ganhar na loteca, comprar uma TV de 50 polegadas, conseguir um emprego no governo, desfilar na Unidos do Cruzeiro, e ir pro céu. Muitos foram nessa. Confesso que me adaptei em Marte melhor do que esperava, não é dos piores lugares em que estive. Primeiro, fui mandado pra Amazônia, era como se fosse Marte, antes dos americanos baixarem lá (vazia, calor infernal, sem falar nas doenças). O pior era a distância do Rio, que, naquela época, era o centro do meu universo. Depois fui pra Brasília nos inícios, aí era Marte mesmo, sentia falta de ar, meu nariz sangrava, faltava tudo, a poeira vermelha cobria até a Esplanada dos Ministérios. Faltava até mulher, que no Brazyl (agora com z e y, é a nova nomenclatura, fazer o quê) havia em profusão nas praias lotadas, depois inventaram essa de mulheres trabalharem para adquirir liberdade, e agora estamos nesse impasse, elas querem voltar pra casa e querem liberdade. Aqui em Marte raramente são vistas, e quando aparecem, são como os pardais, andam em bandos, chilreando e com o dedinho iluminado, sinal que estão na fase fértil. Outro dia, pensando em encontrar uma marciana mulata e tentando matar a curiosidade sobre a fisiologia sexual delas, dei uma volta pelos subúrbios, fui conhecer a “Terra de Marlboro”, queria ver os tais redemoinhos gigantescos, peguei um carro-voador blindado, com dois robôs, vi muitos homens armados, usando aquelas máscaras do Darth Vader, dando bascolejo, sem mais nem menos deitavam os suspeitos no chão, pisavam nos ovos dos caras com aquelas botas pesadas, metiam a porrada e os transeuntes aplaudiam. Este passeio pelos subúrbios de Marte me deixou muito triste, tive que tomar um rivotril que trouxe do Brazyl, é recomendado pra tristeza e amargura. É que a pobreza me deixa amargurado, é a coisa de que mais tenho medo: voltar a ficar pobre, sem dinheiro, vocês podem imaginar, Nelson Rodrigues já dizia: “dinheiro compra até amor verdadeiro”. E compra mesmo, até em Marte. Paramos numa esquina barulhenta e poeirenta, e logo me apareceu um menino com uma telinha, onde a cada toque se via uma marciana, algumas belíssimas. Quanto é? Ele abriu a mão de treze dedos. Treze? Fez uns sinais dando a entender que eu poderia negociar direto com ela. Hoje não, tomei o comprimido pra ficar alegre, mas o meu tesão foi pro brejo, efeito colateral e, depois, meu motorista disse que estava escurecendo e que seria perigoso continuar naquela área.
Próximo a minha casa, nas margens do Mare Sirenun, reencontrei o escritor, disse chamar-se Lorquas Ptomel, pedi à robozinha (coisa linda, só vendo), pra servir um café, estava um tanto curioso para conhecer a cultura local. Ele era o rei das perguntas chatas: perguntou-me pelo Ray, eu nem consegui dizer que ele morreu em 2012, insistiu com a pergunta sobre o Edgar, pensei que ele queria saber alguma coisa do Tarzan ou então estava falando do outro Burroughs, filho do inventor da máquina de escrever (acho que vocês não sabem o que é), mas não, me disse que o cara escreveu vários livros sobre Marte. Fingi que já sabia, fiquei saboreando o café e apreciando a bunda da robô, nem ouvia as abobrinhas que o marciano falava, com aquele ar entediado, comum aos escritores, sejam de Marte ou de Brasília. Botei a vassoura atrás da porta e aguardei (é o verbo mais usado por aqui). Assim que o escritor marciano deu a entender que ia embora, pensei: hoje eu pego essa robô de qualquer maneira. Vocês não fazem ideia do que seja fazer amor com uma robô, sim, porque com ela eu fiz amor e não sexo, é como se tivesse voltado aos inícios dos anos 70 do Brazyl. Não fazem ideia do que seja fazer amor olhando pro céu estrelado de Marte, sem nenhuma nuvem, nada, céu azulíssimo. Agora começo a entender porque os dois Impérios que mandam na Terra gastaram bilhões de dólares e outros tantos de Yuanes pra se estabelecer aqui. Só fazer amor em Marte com a Seane (coisa mais linda) já teria valido a pena. Lembram-se da Rachael, do Blade Runner, é a cara e o corpo dela, só que “com uns quilinhos a mais” como ela me disse, quando a escolhi na tela da minha sala, olhando-me com aquele olhar marrom-claro e os cabelos presos na nuca. Quando ela levanta a cabeleira negra liberando a nuca, é o céu, o céu de Marte. Depois de uma noite de sono, que há muito não tinha tido, sem ter nem porquê, meu pensamentos voaram pro Brazyl, tenho essas recaídas, dizem que a palavra só existe na língua marciana: saudade. Nessas horas, sempre lembro de uma frase do Gregório de Matos (não deve haver mais vestígios nem no Google): “Que me quer o Brasil, que me persegue?” Parece papo do Lorquaz Ptomel, o escritor marciano, mas a frase me empurra para o passado distante, mesmo que eu não queira ir. Acordei tarde, botei meus óculos protetores, sapatos de chumbo, pra me segurar no chão, olhei pela janela e quem estava na porta pra me importunar? O Ptomel, com aquela cara de interrogador, querendo saber como era Brasília. Pensei: porra, esse cara vai infernizar minha vida por aqui, logo agora que a minha robozinha está no período fértil. Vou contar logo o básico e ver se me livro deste chato.
Houve uma época em que se imaginou que seríamos um Império grandioso: “O Império do Meio do Mato.” Lá se vão cem anos, foi no reinado de Ramsés de Oliveira e Marte ainda era chamado de Planeta Vermelho e só existia nos sonhos do Schiaparelli (deve ter no Google) e nas histórias do Bradbury, que não tenho saco pra ler, detesto ficção científica. Para entender o presente, e o que vim fazer em Marte, é preciso dar uma olhada no passado. Infelizmente, é o passado que cria o futuro, se o passado foi uma merda, porque o futuro seria diferente? Está nos livros de história, tudo começou com o príncipe Ramsés, que subiu no Morro do Cruzeiro e disse com a pompa de sempre: “daqui, deste curral, que será o palco das grandes decisões nacionais, fica criada esta ilha chamada Brasília, onde, como disse Dom Bosco, correrá muita grana e muito mel”. Desculpe Ptomel, mas li a frase antes de derrubarem a Rodoviária, não me lembro com exatidão. Chamou então o grande arquiteto do universo (Deus), e disse-lhe ao pé do ouvido: “Oscar, quero uma cidade bem egípcia, muitas pirâmides, muitos palácios e o Rio Nilo em volta, não importa quanto vai custar”. Está claro nos textos bíblicos que ele se referia ao grande Oscar Niemeyer, que hoje está com 200 anos, completamente lúcido. Oscar convocou seu compadre, o resto, todo o mundo sabe: ele fez uns rabiscos e um pouco de literatura. Alguns criadores de caso avisaram: “isto vai dar merda”. Os empreiteiros e fazendeiros berraram bem alto, cada qual defendendo seus pastos. Ramsés não quis nem saber, pediu grana emprestada aos gringos pela tabela Price, os gringos achavam que valia o risco, queriam ordem no seu quintal, pensavam que poderíamos ser um grande “mercado” para seus produtos. Ramsés chamou os pelegos-chefes do IAPI, IAPETEC, IAPC e outros IAPs e exigiu a grana acumulada na CAIXA para pagar a aposentadoria dos trabalhadores. Não, príncipe, é para o nosso futuro, disseram os pelegos. Ramsés retrucou na bucha: o futuro é agora, lasca o pau e manda rodar a manivela. Por essas e outras é que chamam a cidade de “O Túmulo do Faraó”. O problema é que o príncipe que sucedeu Ramsés, um magrelo apelidado “Vassourada”, um dia acordou de ressaca e cismou que não ia morar mais no Palácio da Alvorada, reclamava daquele silêncio de túmulo e do frio cortante do cerrado. Dizia que mandava menos que o prefeito de São Paulo e tinha razão, como alguém ia comandar um continente de dentro de um palácio a beira do Lago Paranoá, sem o Google, sem Facebook, sem o MSN e sem o Badoo? Era o problema de sempre, as legiões não o levavam a sério. Resultado: foi varrido do poder. Renunciado. Um espanto, nunca se soube de alguém que tivesse renunciado a nada em Brasília, no máximo o sujeito pede licença sem vencimentos. Enquanto rolavam essas complicações nos altos escalões, o povo (sempre mal informado, só viam o programa do Chacrinha e ouviam o futebol), chegava aos borbotões, em busca da grana e do melado, mal sabiam que a grana tinha dono e o melado estava sendo disputado em recinto fechado, no Palácio das Duas Tigelas, também conhecido como Vinte e Oito, em homenagem aos 28 que caíram lá de cima na sua construção (alguns, de vez em quando, saem da tumba e desempatam a votação). Os gringos, que já andavam ressabiados por causa dos cubanos, a essas alturas começaram a desconfiar que não receberiam a grana, e que aqui dentro, caberiam umas seiscentas Cubas. Se uma, comandada por um lunático, já dava um trabalho danado, calcule seiscentas. Então chamaram os militares. Estávamos na época do “nacional-devedorismo” (devo, não nego, pagarei quando puder), doutrina criada pelos militares nos anos 40 do século passado. A proposta era crescer endividando-se, como faz o povo até hoje no Ponto Frio e nas Casas Bahia, confiando que amanhã vai estar tudo muito mais caro. A ideia era construir uma cidade que fosse o contrário da bagunça brasileira. Tudo certinho, organizado (cada coisa em seu lugar, um lugar para cada coisa). Só que a bagunça brasileira também foi planejada, não se cria uma esculhambação como o Rio, Salvador, São Paulo, Recife, Belém, de uma hora pra outra, são coisas planejadas, de séculos. No final do mandato, Ramsés fez uma viagem (ele gostava muito de viajar) pra Paris. Os milicos entraram e trataram de consolidar a cidade, afinal iam morar nela por muitos anos. Logo notaram que O Vassourada nada tinha feito e Jango, como percebeu Glauber Rocha, era um fazendeiro-poeta, mais fazendeiro que poeta, queria mudar o imutável sem sair da fazenda. A capital cresceu mais do que qualquer outra cidade em todos os tempos, os súditos do príncipe Ziror, que governou a cidade nos começos, passaram de 140 mil almas, em 1970, para mais de 10 milhões. O problema é que as cidades tem o péssimo hábito de mudar o tempo todo. São como caleidoscópios (uma metaforazinha que o Lorquas Ptomel gosta, ele adora também o verso do poeta Saint-John Perse: “As cidades crescem, enquanto as mulheres sonham”), diz ele que os sonhos femininos são confusos. Pensei: este Ptomel parece misógino, acostumou-se mal com a obediência das robôs, vive no passado distante, talvez pra se proteger, quem sabe, ou talvez porque os marcianos são assim mesmo, quando ficam velhos. Os marcianos são pessimistas, só falam em problemas, o Ptomel chegou ao ponto de me dizer que problema algum tem solução definitiva, diz ele que apenas mudam a forma. Ele falando estas abobrinhas e eu pensando na minha robô (coisa mais linda), depois que ela dorme fico observando Brasília aqui de cima, o mais interessante é que ela dorme com os olhos abertos. O Ptomel quer saber quais são nossos problemas. Sei lá, a minha robozinha deitada me esperando e eu tendo que falar de problemas em Brasília, quero lá saber daquela politicagem, esse Ptomel tem cada uma. Acho que o problema principal de que acusam o príncipe Ziror é a “Grande Muralha Medieval”, construída em 2030, para controlar a entrada dos bárbaros. É que não só os DAS estão dentro da Muralha, mas também os hospitais, cinemas, teatros, universidade, restaurantes, lago, zoológico e até o melhor cemitério. Até o samba está do lado de dentro. De vez em quando, alguém pula a “Muralha”, geralmente no Natal e Carnaval, mas logo as legiões do príncipe Ziror III tratam de expulsá-los. Apesar dos contratempos, tudo ia bem, mas como diz um ditado marciano: “depois da tempestade, sempre vem outra”. O horóscopo do príncipe Ziror III dizia que Netuno estava na sua casa e que sua eleição estava garantida, aí, não mais que de repente, os centuriões do Rei Lulácio, também chamado “Sapo Barbudo”, o matador de andróides, mandaram prender o príncipe Ziror III, período que ficou conhecido como “Arrudaço”. Daí pra frente, as coisas se acalmaram e a vida continuou como sempre foi, Marte brilhando no firmamento, Vênus tranquila desfilando sua beleza e minha robozinha dormindo de olhos e pernas abertos. Confirmando o ditado marciano, aconteceu o improvável, a inflação voltou com tudo, pegou a Rainha Dilma com as calças na mão, não teve jeito, a Rainha, apelidada de “a imutável”, jogou nas telas o plano “Real Novo 2.0-Turbo Flex”. Isto foi bem antes da Copa do Mundo de 2052. Brasília sediou uma das chaves, construíram um estádio pra um milhão de torcedores. O Rei Lulácio VI, que voltou a governar, deu o pontapé inicial, errou a bola, mas acertou no discurso, dizendo ser candidato a Imperador de Marte. Já me cadastrei (em Marte você não faz nada sem se cadastrar), pra votar. Mas vocês devem estar perguntando: por que fui transferido pra Marte? Simples, é que morri, e pra lá vão os espíritos superiores. Ou não leram o livro do Ramatis, o escritor preferido do Lorquas Ptomel, meu vizinho?