REVITALIZAÇÃO (do Rio São Francisco) – UMA EPOPÉIA -por manoel bonfim ribeiro

                                    “ O homem é a única criatura que
                                     combate a natureza, com loucura”
                                                                              J. Swift

 

Com os compromissos assumidos pelo Governo, de aprofundar os estudos  da Transposição do São Francisco e dar prioridade ao Programa de Revitalização,   após a revolta pacífica de Dom  Luiz Cappio em 2005, (um fato que merece registro) podemos debruçar, agora, sobre este grande tema que é a salvação do nosso rio. A atitude de um homem forte, trouxe à mostra da sociedade o desprezo e o abandono que o Governo tem  por esta grande jugular do Nordeste brasileiro.
Por todo o século XX, o Governo, com inicio no final do Império (1886), construiu, no Nordeste, a maior rede de açudagem do Planeta . Foi também neste mesmo século XX que o rio São Francisco foi literalmente demolido. Enquanto se construía lá, se demolia cá. Cerca de 40  navios a vapor, singrando de Juazeiro a Pirapora, 1371 Km,  consumia, como lenha, anualmente,  900 hectares de mata ciliar, . A agricultura empírica, com  métodos rudimentares, foi deixando o solo do Vale totalmente desnudo. No tempo de Cabral, a  bacia hidrográfica do rio tinha total cobertura verde, a chuva caia sobre a copa das árvores, escorria pelas galharias, e ia formar os lençóis  freáticos  que alimentavam o seu talvegue. A água era cristalina, não tinha carreamento de material sólido, a máxima enchente era  de 12.000 m³/s  e a mínima  5.000 m³/s, em termos gerais.  Era um rio equilibrado.
Agora temos um vale desnudado pela sanha dos madeireiros e por outros processos destrutivos. Solo calcinado, as águas das chuvas descem  como um bólido , abrindo grandes  voçorocas, aterrando o rio e os seus tributários. A largura se abriu de 500 metros, em média, para 1000 metros, pelo fenômeno das terras caídas.  A máxima  chegou  a 19.000 m³/s e a mínima a 500 m³/s , 3% da máxima – rio desequilibrado .Com o mesmo volume de água, mas com sua largura  dobrada, o momento de calado  caiu, perdeu-se o tirante de navegação, prejudicando totalmente a  navegabilidade do Grande rio. O homem é um vândalo, um destruidor das messes que a natureza nos oferece.
 A poluição do  São Francisco ocorreu  pelo processo natural  com o aumento populacional. A poluição dos rios da Terra é causada pelo homem inculto e pelo homem civilizado. Todos fazem do seu rio uma  cesta de lixo. O homem vive em função do rio, mas ele  é o seu próprio algoz. Toda a  concha hidrográfica do nosso rio tornou-se,  totalmente, degradada.
A  revitalização  deste grande  rio é  a inversão do processo a que chegou,  é o restabelecimento de toda a bacia deteriorada e mutilada pelas ações  antrópicas  exercidas ao longo do século XX.
Vejamos em que consiste a tão comentada  revitalização, que não é nada fácil:
Projetos existentes.  Reunir e ordenar todos os projetos e programas da Bacia. Existem cerca de 500 projetos entre particulares e públicos, municipais, estaduais e federais, que devem  ser ordenados e priorizados, tendo a Bacia  como  unidade de planejamento.
Hidrometria.  Recuperar e ampliar a rede hidrométrica do rio e de todos os seus tributários: fluviometria,  pluviometria , temperatura,  evaporação, insolação, etc, que é o recenseamento  do rio, das  águas de toda sua bacia.Trabalho caro , penoso e demorado. Foi um programa que já existiu  no tempo do Departamento de Portos e Vias  Navegáveis,  hoje, totalmente esquecido e desprezado.È a vida de um rio.
Sedimentometria.  Instalar  postos no rio, nos seus tributários  e nos seus barramentos. Estes postos sedimentométricos,  distribuidos  por toda a  bacia, medem o material sólido carreado pelas águas,  no período sazonal de  cheias, responsável pelo grande assoreamento da calha principal, que  obstrui a navegação e  promove o aterramento das grandes represas construídas.
Reflorestamento.   Bacia hidrográfica do rio com 168 confluentes,  rede filamentar  de riachos  e  milhares de  micro-bacias. Trabalho demorado e árduo com técnicas apoiadas na silvicultura, na arboricultura e na vegetação de baixo extrato, adequadas  á vocação do solo, para conter os processos erosivos do Vale, recompondo todo o seu manto verde. Esta operação gigante, mesmo abstraindo cidades, vilas, sistema viário e projetos  agropecuários  deve atingir mais de 40% da bacia hidrográfica do rio.
Lagoas marginais. Consiste na restauração das lagoas, maternidade e berçário de toda a fauna  potâmica. . Estas lagoas ganglionares, ao longo da calha, em ambas as margens, são o  útero do rio,  hoje,  destruído, literalmente, pela mão do homem. A fecundação dos peixes  reofílicos, responsáveis pela piracema, é extra corpórea e o nascimento dos alevinos ocorre nessas lagoas  rasas e quentes. Grande nicho de reprodução, com rica e farta alimentação para anfíbios e répteis, para a fauna terrestre e alada, onde pássaros e insetos se insinuam por  toda a ambiência,  gerando  um bioma de vida própria -água,  vegetação, fauna e  homem – a que chamamos de biocenose. Esta é a vida que faz pulsar  o rio.
Despoluição.  Tema  para adultos. Não é impossível   mas haja dinheiro. A poluição teve o seu começo nos primórdios da civilização, excrementos humanos, animais mortos, lixo. Depois vieram  os biocidas,  a química, os agrotóxicos, a mineração, etc. A poluição contrasta com todos os índices de civilidade. O NILO e a sua fantástica rede de canais está  contaminado pelos insumos agrícolas. Cairo e Alixandría  lançam fosfatos e nitratos no rio, poluindo o litoral mediterrâneo. O TÂMISA , no inicio dos anos 90, era uma cloaca e a Agência inglesa  “Nacional Rivers Autority” ( NRA),  em 9 anos, ressuscitou o rio, deixando, hoje,despejar  suas águas cristalinas  no Mar do Norte. O GANGES,  rio místico, cheio de lendas e fábulas, recebe, “in natura”,  os dejetos de  cidades milenares como Nova Delhi,  Benares, Patna, e Calcutá, esta, o  maior porto fluvial da Índia. O RENO, em 1986, ficou vermelho de mercúrio, 300 toneladas de pesticidas destruindo a  micro e macro fáuna e a  microflora do vale,  poluíção  vinda de Basiléia, o “Vale Químico da Suíça”.Os paises europeus, todos eles, recebem fortes pressões da Comunidade Econômica Européia para não poluírem os seus rios. O PARAÍBA DO SUL, cujo vale é o mais industrializado do Brasil ,( Minas Gerais, São Paulo e Rio), com Votorantin, Refinaria, Cervejarias, etc , só possui 12% dos municípios com tratamento de esgotos. O CAPIBARIBE, com seus 250 Km de extensão, renasceu  no inicio dos anos 90, com o modelo matemático dos ingleses usado no Tâmisa, mas o vinhoto e  a lama negra  e fétida já voltaram ao seu leito. O PARNAÌBA, irmão siamês do São Francisco,  está com seus mananciais soterrados, suas belas nascentes nos contrafortes da Serra das Mangabeiras estão obstruídas. Voçorocas imensas.  No TIETÊ, já foram gastos mais de US$ 2 bilhões e continua sendo um exemplo indesejável de poluição. São 40.000 indústrias e 1,3 milhão de Ton/dia de esgotos. A  capacidade de tratamento operada pelo Governo, representa,  apenas, 10% da capacidade que tem a sociedade de polui-lo. Vergonha nacional. A lista de rios poluídos é infindável. E o VELHO CHICO, o rio que  querem tirar do lugar! À sua direita, o rio das Velhas  recebe, diariamente, 470 toneladas de dejetos da Grande Belo Horizonte, não há   BDO que resista. À sua direita, também, o Paraòpeba, contribuindo com  poluição pesada e venenosa, mercúrio, cádmio, zinco, arsênio, tudo gerado pelo  Quadrilátero Ferrífero Mineiro. Acresce mais os agrotóxicos  de 300 mil hectares irrigados, às margens do rio e seus afluentes. Despoluir o rio é um desfio.
Saneamento básico. Existe no Vale do São Francisco 415 cidades e mais de 800 povoações entre distritos, vilarejos e aglomerados humanos, ocupando   terras  da Bacia, em cinco estados da Federação, totalizando 15 milhões de habitantes,  numa superfície de 640.000 Km²,  área  igual á toda a Península Ibérica (Espanha + Portugal) e mais a Dinamarca, três  paises  europeus. Nada, quase nada temos de saneamento. È outro desafio para esta territorial e imensa  bacia hidrográfica.
Navegabilidade.  Este é o último item da revitalização do rio. Instalado todo o processo sedimentométrico  na calha principal e nos seus afluentes e, uma vez, plantado e implantado o reflorestamento da Bacia, determina-se os pontos de depósitos  aluvionais e os seus volumes  para a grande operação de dragagem. Esta dragagem é contínua, rio acima e rio abaixo, ao longo do curso principal e dos afluentes navegáveis,  garantindo uma navegabilidade permanente durante os 365 dias do ano. Só assim o transporte fluvial  poderá ser restabelecido.
O grande paradigma, um exemplo para o mundo inteiro, é a revitalização do vale do rio TENNESSEE,  a conhecida TVA  (Tennessee Autority Valley) que se tornou um símbolo de desenvolvimento hídrico unificado. A bacia foi projetada e executada como um todo, respeitando a unidade da sua própria  natureza. Ela tem uma área de 360.000 Km², metade  da bacia  do nosso rio e despeja 60 bilhões m³/ano no Ohio, um sub-afluente do majestoso Mississipi. O São Francisco despeja 100 bilhões no Atlântico. O Presidente Franklin Delano Roosevelt elegeu essa revitalização, como  a grande epopéia da sua  administração. Em 20 anos (1933-1953), planejou e construiu toda sua obra: 39 grandes barramentos, sendo cada um deles, um pólo de energia, um pólo de piscicultura, um pólo de irrigação e um pólo de turismo. Restabeleceu a navegação em 1.040 Km dos seus 1.650 Km de extensão, e mais, criou, dentro da bacia, 233 parques de recreação, todos com boa infra-estrutura. Suas margens são perfeitamente contidas e encaixadas, a  água é cristalina, um rio niveal e indômito, hoje, um rio sereno e majestoso.
Este, é um rio revitalizado  na acepção técnica do termo. É tudo o que temos a fazer no rio São Francisco. Diante do que expomos, a REVITALIZAÇÃO DO SÃO FRANCISCO É UMA EPOPÉIA, obra para 30 anos ininterruptos, um projeto governamental para administrações sucessivas.

 

rio são francisco. foto de joão zinclar. ilustração do site.

3 Respostas

  1. No município de Tiros,onde moro tem um córrego com grande volume de águas que deságua no São Francisco,cerca de 4 a 5 anos atrás fomos beneficiados com um projeto para despoluir este córrego,na cidade houve muitas obras para tratar a rede esgoto só que depois de toda a obra concluída”que levou bastante tempo e causou muitos transtornos,sem falar no alto custo”nunca colocaram pra funcionar,o córrego continua poluído,gostaria de saber o que poderia ser feito para por em prática o funcionamento desta obra,de quem cobrar????????????????O córrego de Tiros pede socorro.

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  2. nao tem minha pesquisa

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  3. ajude a combater a despoluir rios que isso gente e o nosso futuro depois nos estamos sofrendo com isso sem água se ter como lavar roupas ?

    ajude esssa obra?

    taliana ferreira silva?

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