CÓDIGO E LINGUAGEM, METALINGUAGEM por décio pignatari
Vê-se por aí que código e linguagem são basicamente uma e mesma coisa, a ponto de podermos dizer que o Português é um código, e o Inglês, outro. O que não impede que, sem certas circunstâncias, e para maior clareza, se faça uma distinção entre linguagem e código, como o faz Colin Cherry. Para ele, linguagem é “um vocabulário (de signos) e o modo de usá-los”, um conjunto de signos e regras, tais como os que usamos na conversação diária, de um modo altamente flexível e, até, bastante “ilógico”. As mensagens podem ser codificadas quando já expressas por meio de signos (letras, por exemplo); então, uma codificação seria uma transformação, geralmente unívoca e reversível, por meio da qual mensagens podem ser convertidas de um conjunto de signos para outro. O código semafórico e o código dos surdos-mudos – melhor ainda, o Código Morse – representam exemplos típicos. Dessa forma, as linguagens teriam um longo desenvolvimento orgânico, enquanto que os códigos seriam inventados para algum fim específico e sujeitos a regras explícitas. A verdade, no entanto, é que na medida em que se introduz a ambigüidade num código – ou seja, quando a sua reversibilidade não é perfeita – ele começa a tingir-se de certas características de linguagem, ou melhor, de língua.
De outra parte, convém fazer a distinção entre língua e linguagem, ainda mais quando vemos que, em Inglês e Francês, as palavras “language” e “langage” são tomadas como sinônimos de “língua”, Por esta razão, no que nos toca, consideramos as línguas como manifestações particulares, fundamentais embora, da linguagem, e a Lingüística como um ramo da Semiótica, que pode, assim, ser considerada como a Linguagem (ou: princípios gerais que comandam toda e qualquer manifestação da linguagem).
No estudo da linguagem, uma última distinção se faz ainda necessária: entre linguagem-objeto e metalinguagem. Linguagem-objeto é a linguagem que se estuda; metalinguagem é a linguagem com que se estuda, é a linguagem instrumental, crítico-analítica, que permite estudar a linguagem-objeto sem com ela se confundir. Ou ainda: quando a linguagem-objeto se volta sobre si mesma, ela tende a ser metalinguagem, beneficiando-se da fenomenologia. Este fenômeno é particularmente notável nas revoluções artísticas e de “design” (Dada, neoplasticismo e pop, nas artes visuais; dodecafonismo, música serial e eletrônica, na música; “nouvelle vague”, no cinema; Mallarmé, Joyce, Pound, poesia concreta, na literatura; a revista Mad em relação às linguagens dos meios de comunicação de massas; Mies Van Der Rohe, na arquitetura).
Segue-se daí que toda metalinguagem é marcadamente sintática, formal, estrutural. É por ignorância deste fato e pela tendenciosa e hegemônica formação cultural de tipo lingüístico (melhor dizer literário), que a maior parte da chamada crítica de arte – literária, visual, musical, cinematográfica, arquitetônica – se manifesta “literária” e subjetivamente: carece de metalinguagem adequada (voltada que está, aristotelicamente, para o “conceito”, o “conteúdo” a “significação”). O criador está por dentro da linguagem; o crítico, por fora. O criador se alimenta de raízes da linguagem; o crítico, de suas folhas, flores e frutos. O mesmo se diga dos professores de nossas universidades, ao abordarem o fenômeno artístico. A metalinguagem é um processo dinâmico, mas é comum ver como ela tende a se estratificar em código, confundindo-se então com o jargão técnico, especializado.
Texto escrito em Janeiro de 1968.
coletânea CARPE DIEM. Curitiba.
Rumorejando (Com a volta da inflação, cada vez mais o cinto apertando). – por josé zokner (juca)
PEQUENAS CONSTATAÇÕES, NA FALTA DE MAIORES.
Constatação I
Rico é bem-intencionado; pobre, é faccioso.
Constatação II
Rico pondera; pobre, é leviano.
Constatação III
Fui defender minha liderança
Dentro do meu doce lar
Como após a tempestade
Sobrevém a bonança
A também doce cara-metade
Mandou, sem mais delongas,
Xingando-me de xongas*
Eu, incontinente, pirar**.
*Xongas = “coisa nenhuma, nada” (Houaiss).
** Pirar = “Retirar-se discretamente, cair fora, dar o pira” (Houaiss).
Constatação IV
Em certos países, os assaltantes matam como se fosse a coisa mais corriqueira do mundo. Pelo jeito, pra quem não se importa com o fato, também…
Constatação V
Deu na mídia: “IBGE: mortalidade infantil caiu 64% de 1980 a 2006”. Rumorejando: Imortalidade de deputados e senadores não caiu. Sempre foi de 0%. Salvo rarísssimas (assim mesmo, com três esses para enfatizar o fato…) exceções, alguém se lembra de algum deputado e/ou senador que mereça os encômios da nação?
Constatação VI (“Poesia” do cotidiano).
Ponderou com a patroa
Que a comida não tava boa.
“Vai comer no boteco da esquina
Lá o ‘Jesus me chama’
É iguaria fina,
Recheada com salmonela,
Cozida numa suja panela.
Aí, você cai de cama
E, mais depois, finado,
Nunca mais reclama
Do meu suculento
Cardápio de ensopado
Preparado com esmero
Em fogo lento
E sem exagero
Do meu preferido tempero”.
Coitado!
Constatação VII
Rico faz acordo; pobre, conluio*.
*Conluio = “Cumplicidade para prejudicar terceiro(s); colusão, trama; ajuste maléfico” (Houaiss).
Constatação VIII
Não se pode confundir desperto com esperto até porque tem que ser esperto para adormecer, quer dizer não desperto quando se ouvem discurso de político e/ou as empulhações em época do horário gratuito. E, que fique bem claro, de todos os partidos, sem exceção. A recíproca é como é e tá acabado. Tenho democraticamente dito.
Constatação IX
A pedido do meu dentista
Fiz uma panorâmica,
Um baita de um raio-x.
Eu não sou alarmista
Mas a chapa revelada
De vermelho tava manchada
E me deixou assaz infeliz:
Mostrou dois dentes de cerâmica,
Pontiagudos, assim como, também,
Os que lembram Frankenstein.
Constatação X
“Só um segundo”,
Ela falou
Ao telefone.
Ele esperou
Sem estar insone
Mas, com a demora
E o adiantado
Da hora
Caiu num sono profundo
Quando acordou
Só escutou
Ti… ti… ti…
Aí, incomodado
Pôs-se a pensar
Num raio, não o do círculo,
Nem o da circunferência,
Mas o “que a parta”,
Já que ela está de mim farta.
E se pôs a cantar,
Da vida, fulo,
Sem muita paciência,
O bolero “Sem ti”.
E se sentindo no abandono
Também um pobre dum mono,
Perdeu totalmente o sono.
“Vou pôr os pingos no i”,
Pensou todo amuado.
Coitado!
Constatação XI (Subsídios para uma nova versão de uma velha marchinha de carnaval).
Passou pela minha moleira,
No fim duma segunda-feira
Qual um vento numa veneta*,
Que o pirata da perna de pau
Absolutamente não é perneta
Tampouco, tem cara de mau.
*Veneta = “impulso repentino”.
Constatação XII
Não se pode confundir balela com baleia, principalmente quando alguém conta que montou numa baleia e com o guarda-chuva aberto saiu velejando por mares nunca antes navegados. Não acreditem porque é uma balela. Afinal, não tem guarda-chuva que resista ao vento, sem virar no avesso, provocado por uma baleia singrando o oceano na velocidade que ela normalmente costuma…
Constatação XIII
Deu na mídia: “Um em cada quatro casais no Japão não faz sexo, diz pesquisa”. Taí mais uma notícia de transcendental importância para o futuro da Humanidade. Salvo no lamentável caso de se generalizar pelo mundo afora, virando epidemia, endemia, pandemia, coisas assim desse jaez…
Constatação XIV
Amor, teu nome é ternura;
Desamor, teu nome é agrura.
Benquerença, teu nome é doçura.
Desavença, teu nome é broxura
Constatação XV (Coitado!).
Ela sempre cerzia
As meias do marido.
O dedão, um dia,
Também ficou cerzido.
Constatação XVI (Dúvida crucial, via pseudo-haicai).
Dela, a terrível vendeta
Foi exagerar na dose
Da pimenta malagueta?
Constatação XVII (De diálogos um tanto burocráticos e um tanto rimados).
-“Quero que você me apronte
O teu atestado de residência”.
-“A senhora tenha paciência,
Ainda to morando debaixo da ponte”.
E-mail: josezokner@rimasprimas.com.br
CHINA. logística no lixo reciclado. foto sem crédito. ilustração do site.
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